«A tarefa fundamental da família é o serviço à vida», escrevia São João Paulo II na Exortação Apostólica Familiaris Consortio (n.º 28). Esta afirmação tem um sentido profundo que somos chamados a contemplar: é na família que se gera a vida biológica, é na família que se nasce e se desenvolve para o mundo psicológico e afetivo e é, também, na família que a criança abre o coração para Deus, para a vida sobrenatural e espiritual. Exemplo claro deste desenvolvimento integral da vida é a família constituída por Louis e Zélie Martin.
Louis nasceu a 22 de agosto de 1823, filho de pai militar, depois dos estudos pretendia entrar na vida religiosa, contudo, sem sucesso. Abriu uma relojoaria em Aleçon. Será nesta cidade que conhece Zélie Guérin, nascida a 23 de dezembro de 1831 e também filha de militar, que dirigia uma pequena empresa de rendas. Casaram no dia 13 de julho de 1858. Quero aqui assinalar o que disse o Cardeal José Saraiva Martins na homilia da Missa em que foram beatificados e que sintetiza o que significou a vivência do sacramento do matrimónio para este casal: «Entre as vocações para as quais os homens são chamados pela Providência, o matrimónio é uma das mais nobres e elevadas. Louis e Zélie entendiam que podiam santificar-se não apesar do casamento, mas através do casamento, nele e por ele, e que os seus esponsais deveriam ser considerados como o ponto de partida de uma ascensão a dois. Hoje, a Igreja não só admira a santidade destes filhos da terra da Normandia, um dom para todos, mas vê-se neste casal abençoado que contribui para tornar o vestido de noiva da Igreja mais belo e esplêndido. Ela não só admira a santidade de suas vidas, como reconhece neste casal a santidade eminente da instituição do amor conjugal, tal como concebida pelo próprio Criador» (Lisieux, 19/10/2008).
Zélie também havia desejado a vida religiosa. O desejo de ambos de se consagrar a Deus levou a que numa fase inicial do seu matrimónio fizessem voto de continência. Ora, sabida a situação pelo confessor, proibiu-os de tal, indicando que o matrimónio a que eram chamados realizar-se-ia plenamente também nos filhos. Nasceram nove, mas quatro deles morreram muito cedo. As que chegaram à vida adulta, sentiram-se todas chamadas à vida religiosa consagrada: Marie, Pauline, Céline e Thérese, Santa Teresinha, tornaram-se carmelitas do Carmelo de Lisieux; Léonie tornou-se religiosa também, mas nas Visitadinas de Caén.
Louis e Zélie educaram as filhas num ambiente de sã piedade cristã e na formação humana pelo trabalho. Ambos eram exemplo de vida cristã íntegra, o que levou Santa Teresinha do Menino Jesus a escrever numa carta: «O bom Senhor me deu um pai e uma mãe mais dignos do Céu do que da Terra». Louis era membro ativo da adoração noturna, da Conferência de São Vicente de Paulo e da Sociedade para a Propagação da Fé e Zélie era fiel terciária franciscana e membro da Arquiconfraria do Coração Agonizante de Jesus. Todos estes meios foram essenciais para o crescimento e desenvolvimento espiritual deste casal, que passo a passo ia percorrendo em conjunto o caminho da santidade, como disse o Papa Francisco na homilia da Missa de canonização: «os Santos esposos Louis Martin e Marie Zélie Guérin viveram o serviço cristão na família, construindo dia após dia um ambiente cheio de fé e amor; e, neste clima, germinaram as vocações das filhas» (Roma, 18/10/2015).
Zélie morre em 28 de agosto de 1877, vítima de cancro. Os primeiros sinais do tumor foram descobertos em 1876 e em 1877 faz com as suas três filhas mais velhas uma peregrinação a Lourdes, onde não recebe a cura, mas o dom de uma fé maior e mais forte para viver a provação da doença. Esta fé vai manifestar-se no total abandono à misericórdia divina, que expressava nos momentos mais dolorosos da doença. A sua morte foi difícil para o esposo e para as filhas, mas oportunidade para se abandonar totalmente à vontade de Deus. Pode viver aquilo que Zélie repetia muitas vezes: «Deus é o Mestre. Ele faz o que quer».
Muda-se para Lisieux, onde vivia um cunhado seu, e aí dedica-se totalmente à formação humana e cristã das filhas, oferecendo-as a Deus. Foi exemplo daquele amor castíssimo de que falou o Papa Francisco a respeito de São José, mas que podemos aplicar também a Louis: «Ser pai significa introduzir o filho na experiência da vida, na realidade. Não segurá-lo, nem prendê-lo, nem subjugá-lo, mas torná-lo capaz de opções, de liberdade, de partir[…]. A castidade é a liberdade da posse em todos os campos da vida. Um amor só é verdadeiramente tal, quando é casto» (Patris corde, n.º 7). Foi esta liberdade que permitiu por-se em marcha para ajudar a sua filha mais nova, Teresa, a colocar todos os esforços, até ser recebida no Carmelo com apenas 15 anos, com autorização do Papa Leão XIII.
Louis é atingido por uma paralisia do lado esquerdo do corpo em 1887 e outros ataques em 1888. Viveu este momento de sofrimento e doença em oferecimento a Nossa Senhora, sempre agradecido por todos os dons que ao longo da sua vida viu Deus conceder-lhe. Os problemas de saúde foram piorando, sobretudo a manifestação de demência, que levava a momentos muito difíceis. No entanto, nos momentos de serenidade mostrava-se sempre abandonado às mãos de Deus e em ação de graças pela sua vida. Em fevereiro de 1889 é admitido na Casa de Saúde de Caen. Em maio de 1892 deixou a Casa de Saúde, ainda que completamente paralisado, sendo levado uma última vez ao Carmelo de Lisieux, onde respondeu ao «Adeus» das suas filhas com um «No Céu!» cheio de fé. Acabará por falecer no dia 29 de julho de 1894, perto de Evreux, para onde tinha sido levado a passar o verão assistido pela sua filha Céline.
O exemplo de vida e a intercessão de Louis e Zélie são um dom para toda a Igreja: mostram como a vocação à santidade é verdadeiramente universal e que todos encontram, com os adequados auxílios divinos, o caminho para o Céu. Isto mesmo expressou o Cardeal Saraiva Martins na homilia da Missa de beatificação, quando afirmou, e com estas palavras terminamos: «Louis e Zélie são um presente para os cônjuges de todas as idades pela estima, respeito e harmonia com que se amaram 19 anos. Zélie escreveu a Luís: Não posso viver sem ti, meu querido Luís. Ele respondeu: Eu sou teu marido e amigo que te ama para a vida. Viveram as promessas do matrimónio: a fidelidade do compromisso, a indissolubilidade do vínculo, a fecundidade do amor, na felicidade como nas provações, na saúde como na doença» (Lisieux, 19/10/2008).
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