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Ser em Fé (por António Bagão Félix)
O que está para além da dúvida abre-nos para a fé.

Porque sem a dúvida a fé não existe.

Ou fingirá que existe, não subsistindo.

É que ter fé não é encontrar, mas buscar.

Não é receber, mas dar.

E na busca e na doação não desfalecer na escuridão.

E na escuridão acreditar que a fé ilumina.

E na noite encontrar o espírito na paz do corpo.

E na luz ver a sincronia do bem, da verdade e da beleza.

Não se tem fé por se pensar possui-la. É-se em fé se, despojados, nos deixarmos possuir.

A fé não é a imposição mas a aceitação de não compreender.

E não compreendendo, sermos senhores de crer ou de não crer.

Em liberdade.

 

A mais pura expressão de fé é sabermo-nos pequenos. Insignificantes. Como a semente.

E na pequenez não termos pressa ou angústia de o deixarmos de ser.

Porque a fé não tem medida e exige paciência.

E na paciência está a maior prova de fé: o sacrifício da purificação.

E na purificação encontrar o Absoluto e menosprezar o relativo.

Porque a fé só é plena se o abandono for total.

 

Mas como despojarmo-nos de um qualquer nada que se transforma em tudo?

Como afastar o tudo relativo e buscar o Todo Absoluto?

Como encontrar a riqueza no deserto?

Como dizer não ao sim e sim ao não?

Como valorizar a morte para a vida?

Como alcançar um minuto que seja de quietude sem mácula?

 

Tem-se fé porque se resiste.

Resiste-se porque Ele ajuda.

Pedimos-Lhe ajuda porque somos fracos.

Somos fracos porque não renunciamos.

 

Buscamos a fé.

Caímos. Renunciamos. Levantamo-nos. Suplicamos. Queremos. Somos.

Por vezes saciados. Por vezes acorrentados. Por vezes afastados.

Na procura do sinal.

Onde já não há tempo, nem razão.

Mas apenas o que existe na não existência.

A essência.

A alma.

 

 

A fé é alegre mas não ri.

A fé é exigente mas não suplica.

A fé é poderosa mas não se usa.

A fé é compassiva mas não passiva.

A fé é inquietante mas não alienante.

A fé é o fermento mas não o condimento.

A fé é o sal mas não o açúcar.

 

A fé é a incerteza da certeza.

A fé é o testemunho da Palavra.

A fé é a continuação da Esperança.

E se a Esperança é a Luz, faço fé na fé.

 

A Fé não facilita. Dificulta.

Mas não destrói. Constrói.

Na amargura da nossa dor.

No temor do nosso sentimento.

Na obsessão da nossa procura.

 

E assim o fim se torna o princípio.

E no princípio está o silêncio.

A expressão sublime da fé.