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Ser, fazer, estar
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Primeiro. Só tem férias quem tem emprego. E muita gente à nossa volta não o consegue encontrar. Ter férias é, nos tempos que correm, um duplo privilégio: poder suspender o trabalho por uns dias, e sinal de poder voltar a trabalhar. Altura, então, para reflectir sobre o valor que dou ao trabalho que tenho. Para aprofundar o sentido de valorização pessoal que me vem de poder contribuir com o meu esforço para a realização de fins que beneficiam o bem comum.
Segundo. Que o desfrutar das férias não se alimente de uma permanentemente sublinhada atitude de aversão ao trabalho. É muito fácil pôr-me a viver as férias pela negativa, como o tempo em que “não tenho que...”: ir trabalhar, levantar-me cedo, aturar este ou aquele... etc. Talvez uma das reflexões mais urgentes seja precisamente esta: como estou no meu trabalho? Que atitude, empenho, profissionalismo ponho no desempenho das tarefas que me cabem? Encontro gosto, sentido de realização? Como posso melhorar a minha experiência de ser trabalhador? A qualidade de vida no trabalho depende também muito da minha atitude interior, mais até do que das condições exteriores. Embora, como todos sabemos, seja muito mais fácil atirar a culpa para tudo o que está à nossa volta...
Terceiro. A dignidade da pessoa humana valoriza-se essencialmente pelo que cada um é, pelo seu ser pessoa, especial e único. É o ser o fundamental. Mas o ser desenvolve-se, exprime-se e constrói-se. Mais do que um dado, um estado adquirido, é um desafio, um convite, uma vocação. O fazer é um elemento central para este processo de construção do ser. A possibilidade de participação, de dar o seu contributo para o bem social, a experiência gratificante de ser colaborador na criação, a superação de si mesmo pela criatividade, o esforço e até o sacrifício, tudo isto vai aprofundando, dando mais densidade e mais valor à minha experiência de ser pessoa e ao meu ser pessoa com e para os outros. O fazer como meio para o ser: aqui está outra reflexão importante. O meu trabalho, e o modo como trabalho, vai-me ajudando a ser cada vez mais? Em que é que depende de mim melhorar a qualidade do meu fazer para crescer no meu ser?
Quarto. Para ser mais, há que fazer melhor. Mas, para ser mais, é igualmente importante aprender a estar. O fazer é activo, intencional, esforçado. O estar é mais passivo, receptivo, contemplativo. Por isso, o fazer arrisca-se a desgastar depressa e a criar dispersão, ficando pelo superficial, o imediato. Enquanto o estar leva-nos ao mais profundo, centra-nos no essencial, permite-nos encontrar o sentido interior das coisas, refaz-nos, alimenta-nos e revigora-nos. Para ser, estar é tão ou mais importante que o fazer. Em tempo de férias, o estar é para se sobrepor claramente ao fazer. Estar no presente, estar na Natureza, estar comigo, estar com os outros, estar com Deus. Boas férias!