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Tony Neves
LUSOFONIAS | Por terras do Bié

O Bailundo foi desaparecendo da vista à medida que nos fazíamos à estrada que nos levaria à Missão de Tchicumbi, no Andulo, já na Província e Diocese do Bié. Tal como acontece na estrada de Cacuso para Kalandula, também aqui as pessoas aproveitam as bermas da estrada para pôr a secar o milho e a mandioca no alcatrão, dando colorido à paisagem e enchendo de gente as ruas. Rumamos na direção do Mungo e passamos na aldeia natal de D. Zacarias Kamwenho, o Tchimbundo, cuja escola recebeu o seu nome. Em Calucinga apanhamos a estrada que liga o Cuito a Malanje e chegamos à aldeia de Tchicumbi, que deu o nome à Missão do Andulo. Ali, desde sempre, trabalham os Espiritanos e as Irmãs de S. José de Cluny, que me acolheram.

Andulo foi considerada uma das maiores Missões da África Austral, como tantas vezes ouvi da boca do P. Carlos Salgado, que ali estava na hora da independência e expulsão dos missionários. O que se pode ver hoje é uma quantidade de edifícios enormes, a maioria destruídos pela guerra. Antes, havia as residências dos Espiritanos e das Irmãs, tinha internatos de rapazes e meninas, o Hospital, o centro de Promoção Feminina, as Escolas, a Escola do Magistério, oficinas várias e um território imenso ao serviço da agricultura e criação de gado. Tudo funcionava em grande e tornava autónoma a vida da Missão, sempre em desenvolvimento acelerado.

Hoje, os Espiritanos e as Irmãs estão de regresso, mas apenas recuperaram as residências, a Igreja, uma parte da Escola e o Hospital. Além da gestão quotidiana da Missão, a equipa missionária visita e anima 86 aldeias, a maioria com acesso muito difícil.

O povo ficou pobre e abandonado com a guerra civil e faz esforço por levantar-se. É impressionante a extensão de terras cultivadas, sobretudo com milho. Mas há muitas lavras em que as plantas estão raquíticas e amarelas, ficando evidente a falta de água, bem como a ausência de fertilizantes, anunciando fracas colheitas.

A visita guiada ao Hospital, com explicações da diretora, a Irmã Ana, mostrou-me quanto os medicamentos faltam e como esta época das chuvas faz aumentar muito o número de casos de paludismo, a doença que mais mata em África. Na estação atual, o Hospital está a abarrotar, com a chuva a facilitar a reprodução dos mosquitos e a fragilidade física a colaborar com esta doença que já devia ter sido erradicada.

Da Missão de Tchicumbi levaram-me para a da Chanhora, por trás do aeroporto do Cuito. Passamos na cidade do Andulo (a 12kms da Missão e com uma placa antiga que diz estar a 245 kms de Nova Lisboa!) e seguimos para o Cunhinga, terra famosa pelo hospital de referência dos Redentoristas, que a guerra destruiu duas vezes e estes missionários reconstruíram outras tantas. Ali encontraria e abraçaria os Padres Paulino Cambungo e Nelson, amigos dos tempos antigos do Huambo.

O caminho ainda era longo, chegamos ao Cunje, onde está a Gare que foi construída para servir a cidade de Silva Porto. De lá, atravessamos o rio Cuito e chegamos à cidade que ganhou o mesmo nome. Passando o aeroporto, metemo-nos numa picada de 7kms, quase intransitável neste tempo de chuvas. Fui acolhido na Missão da Chanhora, nesta terra que foi a minha primeira casa em Angola, naquele já distante 1989! O momento mais forte desta visita foi a celebração, em umbundu, da Missa na aldeia de Jimba Silili, que fazia parte da área missionária que acompanhava na hora da minha chegada a Angola. Tive a alegria de visitar a minha primeira residência em Angola, o Paço Episcopal do Cuito-Bié, onde fui acolhido pelo novo Bispo, D. Vicente Sanombo.

A última etapa em território bieno levou-me à Missão do Chinguar, situada a 75 kms do Cuito e a outros tantos do Huambo. Como fiz em todas as Missões, falei com os Espiritanos e reuni com os Conselhos de Pastoral, encontros sempre muito ricos e fraternos. No Chinguar, visitei o Santuário do Monte Tchimbango, dedicado a N. Sra de Fátima e tive a alegria de presidir à Missa dominical, de casa cheia, e uma animação muito viva, ao ritmo do canto e da dança. Também aqui, os Espiritanos vivem e trabalham com as Irmãs de S. José de Cluny.

A próxima paragem será a cidade do Huambo que me acolheu de 1990 a 1994. Aguardem o rescaldo desta visita que, para mim, é sempre marcante e emocionante.

 

Tony Neves, na Província do Bié