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À procura da Palavra
Para lá dos limites
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DOMINGO DE RAMOS Ano A

“Eles foram e guardaram o sepulcro,

selando a pedra e pondo a guarda.”

Mt 27, 66


É espantoso como três linhas que desenham alguns picos e elevações numa folha com milhares de quadradinhos permitem avaliar o funcionamento de um coração. Foi o médico holandês Willem Einthoven o “inventor” do eletrocardiograma em 1885. E tornou-se possível medir a actividade elétrica do coração. Agradecido pela invenção e por quem sabe ler estas linhas irrequietas (bom sinal, pois quando se vê uma linha contínua, o caso está malparado!) sorrio ao ler a frase por trás do boletim: “ECG estando dentro dos limites da normalidade”! Claro que não pretendo dar notícias da saúde do meu coração, mas achei graça aos “limites da normalidade”. Espero que seja um bom sinal cardíaco, mas levou-me a pensar como seria um ECG ao coração de Jesus!

 

“É verdade, Jesus, ainda não havia destas coisas na Judeia do teu tempo. E até existe um exame que regista as 24 horas de um coração a bater! Como foram as 24 horas da tua Paixão, que os evangelistas nos relatam longamente? Nos limites, ou para lá dos “limites da normalidade?” Como batia o teu coração naquela aclamação popular e messiânica, em que aceitaste a alegria dos pobres e a ambiguidade das multidões? E na ceia (não a última, mas a primeira, como diz D. António Couto!), ao dares o pão e o cálice e ao anunciares a negação de Pedro? Que linhas elétricas ele escreveria quando rezaste no Getsémani e foste levado aos vários tribunais? Quantos limites da normalidade do quadriculado da vida ultrapassaste quando expiraste na cruz?”

 

Entrar no coração de Jesus, especialmente na Paixão, é ousadia. E fazemo-lo todos os anos na Páscoa. Entrar no coração de todos os que nela participam pode revelar-nos como estamos nós aí também. Na normalidade de amizades, amores, bondade e compaixão, e na anormalidade de ódios, raivas, invejas e mentiras. E como é possível que, acompanhando Jesus manso e humilde, Ele pode abraçar, libertar e salvar de tudo o que nos destrói. Porque ama e vive um pouco mais além dos “limites da normalidade”. O coração rasgado dos discípulos, que é o nosso também, por outras paixões que vivemos, não ficou destruído, e com Jesus deixámos de medir em quadrículas as suas admiráveis possibilidades. Os limites para o “pequeno motor” do tamanho de um punho que trazemos no peito lembram-nos como é importante cuidar dele. O “até ao fim” do amor e da entrega, que a Páscoa de Jesus nos convida, lembra-nos como a alegria pascal superará os sinais da morte.

 

Desejo que os vossos ECG’s estejam “dentro dos limites da normalidade”. E que os exames que poderíamos fazer às famílias, às instituições e associações, às igrejas e às empresas pudessem apresentar bons resultados. E ao descobrirmos “corações empedernidos” ou “mortos por falta de uso”, tenhamos a coragem de deixar a “normalidade”, e propor a justiça de Deus sem adiamentos, a responsabilidade humana sem subterfúgios, o amor de Jesus “para lá dos limites”. Quem sabe se com este choque do “desfibrilador pascal” não voltariam a bater alguns corações?

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