Durante o Seminário sobre o Tráfico de Pessoas, promovido pela CAVITP (Comissão de Apoio à Vitima de Tráfico de Pessoas), nos dias 17 a 19 de Fevereiro, lembrou-se a notícia da hospedeira que conseguiu resgatar uma adolescente vítima de tráfico, pelo facto de ter sabido “ler” o sinal de algo estranho entre a menina e um homem mais velho sentado a seu lado; poderia não ter ligado; mas interessou-se e durante o voo alertou as autoridades, de forma que, logo que o avião aterrou, o homem foi intercetado. Este caso apontava para os objetivos do encontro: ter olhos de ver e comprometer-se; ser informado e formar-se para atuar.
Realidade dramática e crime horrendo
É esta uma realidade dramática no mundo, onde nenhuma região está imune, como afirmava Ban Ki-moon. A ONU apresenta uma estimativa de 2,5 milhões de vítimas, sendo 80 % mulheres e estando 500.000 crianças em risco de serem traficadas.
Relativamente ao nosso continente a Comissão Europeia refere 15.846 vítimas, embora destas apenas 6.324 tenham tido contato com a polícia ou com o sistema judicial; 67 % destinavam-se a exploração sexual e 21 % a exploração laboral. Mas há que não esquecer outras finalidades como tráfico de órgãos, servidão doméstica, mendicidade, atividades ilícitas.
Os números, porém, são uma ténue indicação da verdade, reportando-se a estimativas ou a casos introduzidos no âmbito judicial. A realidade é muito mais trágica. Também em Portugal. Pela informação que nos foi passada por Cláudia Pedra, diretora do NSIS, investigadora e especialista em direitos humanos e migrações e consultora do ACNUR, e pela Ir. Gabriella Bottani, coordenadora internacional da Rede Talitha Kum, a surpresa e o choque foram evidentes: primeiro pelo desconhecimento do que se passa, em todas as áreas, desde a generalidade da população até à governação e às estruturas policiais e judiciárias. Mas também por casos vindos ao de cima, como o referente ao desmantelamento de uma rede de tráfico no Alentejo para exploração laboral, ou o caso dos nepaleses em trabalhos forçados na apanha do morango em Almeirim. Nem sequer as crianças a mendigar junto aos semáforos de Lisboa nos incomodam muito. O relatório de 2015 do Observatório do Tráfico de Seres Humanos (OTSH) informa que, desde 2008 a 2015 foram sinalizados 1.306 casos fundamentalmente incidindo na exploração laboral, onde sobressaem os homens, e na exploração sexual, onde sobressaem as mulheres. Destes casos, 377 foram confirmados; 125 estão pendentes e 502 não confirmados, podendo estar abrangidos por outra moldura penal, como imigração ilegal, violência doméstica ou ausência de crime.
O chão onde se desenvolve a semente
Trata-se de um fenómeno que exprime uma tendência da pessoa para tratar a outra como uma coisa de que se pode dispor, que se compra e que se vende, ou que se manipula como objeto descartável. Já na história dos Patriarcas aparece a história de José vendido pelos irmãos (Gen 37,27). Quando se perde a noção da dignidade fundamental da pessoa e aparece o negócio, então surge o tráfico, que constitui uma das formas ilegais mais lucrativas no mundo, com a estimativa de 30.000 milhões de euros ao ano. Nuno Rogeiro, no livro “Menos que Humanos”, a partir de dados e testemunhos, desenha uma operação: um pequeno navio de transporte, que leve 470 a 500 pessoas pode gerar um lucro de 1 milhão de dólares, ainda que se tenha de provocar um naufrágio com centenas de vítimas. Mas também a miséria, a instabilidade e a guerra, a perseguição, a falta de cultura constituem chão fértil para esta praga.
A nossa fé põe-nos em cheque, desde as primeiras frases da Bíblia, com a pergunta “Caim, onde está o teu irmão?”(Gen 4,9) até à sentença final de que “tudo o que fizeste ao mais pequenino, foi a Mim que o fizeste (Mt 25,31). A insistência do Papa nesta questão tem sido frequente. Nessa linha a Santa Sé, para melhor articular o seu contributo em prol do “desenvolvimento humano integral” instituiu um novo Dicastério para atender melhor às exigências dos homens e mulheres que está chamada a servir. A nível dos institutos religiosos foi criada a Rede “Talitha Kum”, uma rede internacional da Vida Consagrada em 70 países, com trabalho no terreno desde 1990 e que nos vai lembrando que não se respeita a Deus se não se respeitar aquele que foi criado à sua imagem e semelhança e que enquanto houver escravos a humanidade não é livre.
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