No país onde uma granada custa menos do que uma lata de coca-cola, a paz continua em suspenso, ameaçada por bandos rivais que se escondem atrás de um falso conflito religioso. O país está a saque, as pessoas em fuga, as igrejas cheias de refugiados. Só a reconciliação pode trazer a esperança do fim da guerra. Deste país em lágrimas chegam-nos pedidos de ajuda.
Marie-Thérèse Bocoum, relatora da ONU sobre os direitos humanos, visitou a República Centro-Africana em Fevereiro. O país está “numa encruzilhada”, constatou. Em Março de 2013, fez agora dois anos, o presidente François Bozizé, um cristão, foi afastado do poder por uma milícia predominantemente muçulmana: os Séléka. Desde então, começaram a surgir bandos armados, os anti-Balaka, que muitos dizem ser compostos por cristãos, mas que a Igreja tem denunciado como sendo apenas “ladrões que estão a lucrar com a revolta contra os muçulmanos”, como explicou o Padre Dieu-Seni Bikowo, à Fundação AIS.
Para as populações indefesas, pouco importa quem segura os machados sedentos de sangue, quem varre as ruas com rajadas de metralhadoras, ou quem, simplesmente, arrasa casas, igrejas, mesquitas, deixando atrás de si um rasto de loucura e destruição.
1 milhão de refugiados
Para as populações indefesas, desde Março de 2013 que a República Centro-Africana é um lugar onde ninguém se sente seguro, apesar da presença de oito mil capacetes azuis das Nações Unidas. Desde o início dos tumultos, da guerra civil que atormenta o país, milhares de pessoas já perderam a vida e há cerca de 1 milhão de refugiados. O caos está instalado em todo o lado. Só na capital, Bangui, pelo menos 30 mil pessoas vivem em condições miseráveis em acampamentos improvisados no aeroporto, em igrejas e em algumas mesquitas. O Arcebispo Dieudonné Nzapalainga, da Diocese de Bangui, confessou à Fundação AIS o seu desespero por não conseguir acudir todas as pessoas que lhe pedem ajuda. “No nosso seminário estão refugiadas 8 mil pessoas, no mosteiro dos irmãos carmelitas, umas 4 mil… Vivem em condições terríveis, estão todos muito traumatizados e continuam cheios de medo. A maior parte, não pode regressar a suas casas pois elas foram destruídas. As crianças não têm escola e ninguém tem trabalho…”
Armas a preço de saldo
As Nações Unidas impuseram um embargo à venda de armas ao Séléka no final de 2013. Um embargo no papel, apenas. Uma organização britânica, a Conflict Armament Research Group, procurou conhecer a proveniência das armas que têm sequestrado este país. O resultado é surpreendente: As granadas vêm da China e da Bulgária. Os morteiros do Sudão. Os foguetes do Irão. As balas do Reino Unido, Bélgica e República Checa. Espanha e Camarões fornecem os cartuchos para as espingardas. As granadas podem ser compradas a 50 cêntimos, menos do que o preço de uma garrafa de coca-cola no mercado de Bangui…
Quando as armas estão a preço de saldo, a paz tem um custo elevadíssimo. D. Nzapalainga, juntamente com os outros nove bispos do seu país, lançou um apelo a todas as pessoas para entregarem as armas nas paróquias. O desarmamento é condição essencial para o fim dos conflitos. No dia seguinte ao apelo, entregaram um caixote com armas no episcopado. Um caixote. “Enquanto as armas continuaram escondidas nas casas das pessoas, não será possível cortar com este ciclo vicioso de violência. A solução para este conflito não está nas armas, mas no diálogo.”
Visita do Papa?
No regresso da visita às Filipinas, o Papa Francisco anunciou a sua vontade de ir a África ainda este ano. A República Centro-Africana, apesar de toda a insegurança, poderá ser um dos países a visitar. Para o Arcebispo de Bangui, essa seria a melhor notícia do mundo. “Para mim, a visita do Papa é um sinal da bondade de Deus e um consolo. Espero que ele traga força e coragem, e que seja portador de uma mensagem de paz e reconciliação: precisamente aquilo que o nosso país precisa mais urgentemente”. E como é que se constrói a reconciliação num país minado pela desconfiança?
Poder da oração
O Arcebispo de Bangui não se refugia em palavras. Há dias, visitou na cadeia um dos líderes das milícias anti-balaka. “Deus odeia o pecado, mas ama o pecador.” Foi assim, cheio de reconciliação e misericórdia, que entrou na cadeia e escutou, durante horas, um dos responsáveis pela onda de violência que paralisou o país. Antes de sair da cela, o Arcebispo ainda ouviu: “Até agora ninguém tinha vindo visitar-me”. Para D. Dieudonné Nzapalainga não se pode desistir da esperança. “Como bispo, sou uma sentinela que se ocupa do seu rebanho – o povo de Deus – e procura infundir-lhe esperança. Mas o povo de Deus é composto por todos os homens, não apenas pelos cristãos”. A República Centro-Africana está a viver um dos piores pesadelos da sua história. Falta tudo mas, para este prelado, a maior ajuda que podemos dar é “espiritual”. “Rezem por nós, isso é o mais importante.”
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