A vida é relação com Deus e com os outros nossos irmãos. Diz Enzo Bianchi que «a doença é um mal, uma desarticulação do ser a que é necessário resistir»[1]. E L. Manicardi defende que a doença é um atentado à plenitude da vida não só porque implica a diminuição das forças e das capacidades físicas, mas também porque provoca dependências, perturba a vida familiar e afectiva, afasta da vida social e profissional, ameaça a vida, põe em causa a fé[2]. A doença, com efeito, não deriva da vontade de Deus, nem o sofrimento é castigo. Em Deus encontramos vida e saúde. É certo que alguns textos do Antigo Testamento sugerem a ideia que a doença e o sofrimento são consequências do pecado, mas essa relação entre doença/sofrimento-pecado é anterior à Bíblia. Tem origem no fundo cultural da humanidade, estando por isso presente em todas as sociedades pagãs. Chama-se o “princípio da retribuição” e tem subjacente uma lógica de “olho por olho e dente por dente”. Constitui a primeira tentativa de compreensão da doença e do sofrimento. É ainda hoje, desgraçadamente, a forma de compreensão de muitos cristãos.
Na perspectiva da revelação bíblica, de forma particular nos evangelhos, o princípio da retribuição veicula uma ideia terrível: Deus é visto como adversário ou inimigo do homem, n’Éle não se pode confiar porque é vingativo. Pode-se perguntar: teria Jesus curado alguém se assim fosse?
O que vemos nos evangelhos, pelo contrário, é Jesus, o Médico divino, numa luta permanente contra o mal, atendendo e curando os doentes de suas doenças e sofrimentos. E a cura, que é física mas também social, moral e espiritual, dá aos doentes a possibilidade de viverem integralmente de novo as suas vidas (O caso mais expressivo é o dos leprosos que tinham de viver na margem da sociedade e da vida). No evangelho de S. João, Jesus diz que a deficiência/doença – cego de nascença- não está associada ao pecado e que na cura se revela a glória de Deus (cf. Jo 9, 3). Mateus (Mt 8, 17), ao dizer que Jesus «tomou sobre si as nossas doenças e carregou as nossas dores» (Mt 8,17; Is 53, 4), está a referir-se à luta sem tréguas contra o mal de que as doenças físicas, psíquicas e espirituais parecem ser de alguma forma expressão e metáfora. Por isso Jesus acolhe e cura as pessoas de suas doenças e sofrimentos.
A doença e o sofrimento não são vontade, castigo ou reparação exigida por Deus. A libertação do mal e a recuperação da saúde parecem ser condições para que o homem viva plenamente a sua vida. A atitude de Jesus deve ser também a postura dos que O seguem. Ordenou aos discípulos que, ao anunciar a Boa Nova, curassem e cuidassem também dos doentes. Mais, disse-lhes que a preocupação com os doentes e os frágeis é lugar e critério de encontro com Cristo: “tudo o que fizestes a um dos meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes” (Mt 25, 40). Se esse mandato se realiza através dos profissionais de saúde, nomeadamente pelos profissionais cristãos, também se realiza na preocupação pastoral da Igreja pelos doentes.
A solicitude pelos doentes, nas paróquias e nos hospitais (pela presença da Igreja no Serviço de Assistência Espiritual e Religiosa) não é um discurso sobre a bondade do sofrimento, de resignação a um destino incogniscível, ou, ainda, um anúncio de libertação, desejada ou não, do corpo. Associada aos cuidados de saúde e tendo em conta as possibilidades e limites da condição humana, na realidade, continua a luta de Jesus pela saúde e pela vida. Mas, para que assim seja, devem os doentes ou seus familiares solicitar os cuidados pastorais da Igreja, na paróquia e, particularmente, no Hospital. Como no tempo de Jesus – eram os doentes que pediam a cura-, também hoje os doentes devem solicitar o conforto pastoral e espiritual da Igreja, a visita do capelão ou assistente espiritual, no Hospital, aos enfermeiros. Tal como Jesus, a Igreja não se impõe. O conforto pastoral e espiritual, no Hospital, é um direito cívico e espiritual dos doentes, e solicitá-lo é defendê-lo.
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Assistência Religiosa e Espiritual nos Hospitais
O serviço de assistência espiritual e religiosa tem como missão providenciar cuidados espirituais e religiosos aos utentes internados nas instituições hospitalares do país, como por exemplo o Hospital de Dona Estefânia, em Lisboa. Segundo o decreto-lei 253/2009, ao utente, independentemente da sua confissão, é reconhecido o direito a pedir o Serviço de Assistência Espiritual e Religiosa e a ser assistido em tempo razoável ou com prioridade em caso de iminência de morte.
[1] Enzo Bianchi & Luciano Manicardi, AO LADO DO DOENTE. O SENTIDO DA DOENÇA E O ACOMPANHAMENTO DOS DOENTES. Prior Velho: Paulinas, 2006, p.27. [2] Cf. ibidem, p. 37.
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