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A. Pereira Caldas
O “homem novo”
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Estamos em plena Quaresma.

É tempo de introspecção, de auto-análise, tempo onde se enraíza o desafio essencial da renovação interior. E é tempo de partilha, tempo onde o outro, o próximo, fica mais perto, para dar e receber, desinteressadamente, apenas como protagonista de um acto recíproco de amor.

A Quaresma é, pois, um profundo apelo à paz que se renova, ano após ano. É um porto onde a esperança atraca e a liberdade se redescobre na consciência do “homem novo”, alicerçada numa crença mais forte e profunda em si próprio – sempre um motor poderoso da vontade.

E se isto é de uma enorme importância no quotidiano da vida individual e colectiva, seja onde for, assume foros de fundamental numa sociedade em grave crise económica e financeira como a que Portugal atravessa. Aqui, perante a tragédia da crescente pobreza que vai rasgando o seu tecido social, o país definha, mergulhado num pântano de números que para uns significam uma coisa e para outros exactamente o seu contrário, todos respirando competência por cada poro e considerando-se senhores e donos da verdade.

Perante o que se passa, os cidadãos, cansados de serem, ao mesmo tempo, bombos da festa e vítimas – estranha parceria… – e sentindo-se, ainda por cima, simples armas de arremesso da “guerra” político-partidária, já pouco mais querem do que conseguir sobreviver, com a dignidade possível, entre a falta de meios e o não querer ver, disfarçado de palavras e promessas, de quem pode e manda.

E aconteceu o inevitável. E grave. Milhares e milhares de pessoas perderam a esperança e a vontade.

Mas, estamos na Quaresma – e Quaresma, já o dissemos, significa renovação interior e partilha. Significa que a esperança não morreu. Vive no “homem novo”, isto é, em cada um e em todos os que tiverem a coragem de olhar para dentro de si e libertar-se do “homem velho” que lhes consome a consciência.

E é a esse “homem novo”, que se lança também o apelo à partilha. Um apelo fundamental à solidariedade. E, em contraponto, à renúncia. Um apelo que em nenhuma circunstância deve ser ignorado. E muito menos quando é imperioso e urgente debelar uma crise social devastadora que parece não ter fim.

Na Quaresma, neste trilhar do caminho preparatório da Páscoa da Ressurreição, a indiferença não tem – não pode ter – lugar.