Domingo |
À procura da Palavra
Puros e impuros

DOMINGO XXII COMUM Ano B

 

"Vós deixais de lado mandamento de Deus,

para vos prenderdes à tradição dos homens."

Mc 7, 15

 

Não podemos acusar os judeus de falta de higiene. E certamente a ASAE não infligiria coimas à falta de salubridade dos seus hábitos quotidianos. O grande problema é que, de tanto lavar as mãos e tudo o que alguém pudesse ter tocado, o conceito de pureza e até de santidade enchia de orgulho os fanáticos cumpridores dos preceitos que se tinham tornado leis religiosas. É tão fácil dizer que algo é para "cumprir a vontade de Deus", especialmente se servir para condenar alguém que não pensa ou não vive como nós! E passar de ideias e preceitos circunstanciais a listas intermináveis de mandamentos, que nem Deus nunca ouviu falar, foi sempre um pequeno passo.

Ainda que possa despertar algum encanto não imagino Jesus com hábitos de "hippie", embora não fosse fácil naquele tempo ter as condições de higiene que hoje desfrutamos. Mas Nossa Senhora deve ter-lhe ensinado o mínimo, e bem sabemos como os povos orientais prezam o asseio. O que me parece custar a Jesus é que se valorize tanto uma purificação exterior, a que se associam sentimentos de preconceito e exclusão, e não se cuide da limpeza da alma e do pensamento. O orgulho de serem "o povo escolhido", o medo do estrangeiro e da contaminação moral, a rotina de encontrar pecado e pecadores em todo o lado, certamente ajudaram ao endurecimento de coração que Jesus revela como a doença maior. Que adianta honrar Deus com os lábios se está distante d’Ele o coração?

Não são os mandamentos que Jesus põe em causa. Até os lembra a quem lhos pergunta ou quer alcançar a vida eterna. É o modo de os viver. Como uma lista que enche de orgulho e auto-satisfação, que credita méritos ou lugares mais próximos de Deus, ou como pistas para um amor maior, caminhos de humildade que descobrem os outros como irmãos, horizontes mais largos para o coração. Talvez, por isso, o essencial está no mandamento novo do "amai-vos como Eu". Que já não divide em puros e impuros, mas abre-nos à surpresa de Deus.

É claro que gostaríamos que o inimigo e o mal viessem sempre de fora. Que o diabo fosse o mafarrico horrendo do qual fugiríamos assim que o víssemos. Que o sofrimento do mundo se devesse a uns extra-terrestres malévolos e não a presidentes tiranos ou interesses económicos estruturais. Mas se o mal também nasce e cresce dentro de nós, sem ser preciso andarem espíritos ou almas-penadas a atormentarem-nos, então as palavras de Jesus são um convite a uma atenção constante ao nosso interior. É aí que escolhemos o que queremos ver crescer, decidimos que pensamentos e sentimentos alimentar, e a quem queremos dar a mão. E quem diz "dentro de nós", diz também "à nossa volta", nas famílias, nos grupos de amigos, nas comunidades cristãs. Dar a mão a Jesus "cá dentro" não evita as batalhas mas é "outra coisa". Pelo menos não nos julgaremos melhores que ninguém. E deixaremos de dividir o mundo entre puros e impuros, fiéis e infiéis!

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