Caríssimos irmãos e irmãs,
1. Neste momento de dor e despedida, reunimo-nos em torno do altar do Senhor para celebrar a Páscoa de Cristo no coração e na vida do nosso irmão Padre Robson. A morte, para quem viveu unido a Cristo, não é o fim, mas o cumprimento. Não é um vazio, mas um encontro: o encontro definitivo com a plenitude do amor de Deus, que é fonte e destino da nossa vida. Por isso, quero começar por dar uma palavra de conforto e paz aos familiares e amigos do Padre Robson. Um gesto de estima e afeto também para todos os irmãos sacerdotes, assim como para a comunidade paroquial de São João de Deus, que chora a morte do seu pastor, e também para todas as comunidades paroquiais em que ele foi pastor, Belas e Alto Lumiar, e para os membros das diversas instituições e organismos que serviu: o Seminário dos Olivais, a Universidade Católica Portuguesa, o Secretariado Diocesano do Ensino Religioso e o Instituto Diocesano da Formação Cristã.
2. «Faça-se em mim segundo a tua palavra» (Lc 1, 38), Maria fez-se oferta, entregando ao Senhor a sua disponibilidade e a sua vida. Somente a dádiva total, absoluta, sem reservas da sua humanidade a Deus, tinha a medida justa para que descesse à terra o próprio Autor da vida, para que entrasse no mundo o dom gratuito da Salvação. Esse ‘sim’ tão decisivo constitui uma humilde via para a vinda da maravilha infinita da vida plena. Cada ser humano vem confrontado com o chamamento a fazer-se possibilidade da vinda de Jesus, Deus encarnado, e da sua salvação. É inerente à vocação cristã.
O nosso irmão, o Padre Robson escutou no fundo do seu coração esse apelo e respondeu ao jeito e estilo de Maria. Sim, faça-se em mim segundo a tua palavra. Por isso, se “falar e viver a partir do ponto de vista da eternidade”[1] é a síntese da vida em Deus configurada em grandes vultos de existência evangélica, referida ao Padre Robson, renova-se de atualidade e afigura-se de enorme apropriação, porque ele era, realmente, um tecelão que tecia a vida e a história com fios de eternidade. A sua peregrinação terrena inundava-se da suprema beleza do amor, da verdade e da alegria e o seu magistério sacerdotal definiu-se sempre pela incomensurável mediação do mundo para Deus, para d’Ele aproximar todo o homem, para cada um se descobrir filho muito amado. Envolvido numa aureola de prontidão, incapaz de adiar ou deixar para outros a responsabilidade de responder a qualquer urgência, necessidade ou pedido, vivia no doce sabor do exemplo de Maria Virgem, pronto a correr apressadamente para a montanha da complexidade da existência de tantos. Iluminado pela sabedoria do Evangelho, com o Poeta[2] também ele dizia «para além do ‘ser ou não ser’ dos problemas ocos, o que importa é isto: “Penso nos outros, logo existo”.»
«O povo que andava nas trevas viu uma grande luz; para aqueles que habitavam nas sombras da morte uma luz começou a brilhar» (Is 9,1), a luz da ressurreição de Jesus que crucificado por amor, alcançou a plenitude da vida e, através d’Ele, Deus fez-se tudo em todos. Pelo batismo, morre-se para o pecado e para o homem velho e participa-se da vida nova do Ressuscitado e o quotidiano da vida, com as suas vicissitudes e desafios, torna-se rosto e ícone pascal. Por isso, só da Páscoa de Cristo irrompe a luz que nos visualiza e revela o mistério da vida e também da morte do nosso irmão, Padre Robson. Viveu para os outros, e morreu pelos outros. Na serenidade de uma noite que anunciava o porvir do dia do Senhor, partiu para o Pai, sem testemunhas, mas só, na presença de Jesus… também Jesus ressuscitou no coração da noite inaugural dos novos tempos, libertou-se das amarras da morte sem ninguém presente, mas na intimidade de amor com o Pai. O Espírito vivificador comunicou-Lhe a vida plena no silêncio do mundo. O nosso irmão partiu em Paz transportado na força vitoriosa do amor de Cristo que de nós todos faz dom ao Pai para a comunhão dos Santos.
3. O apóstolo Paulo recordava-nos: «Se vivemos, para o Senhor vivemos; se morremos, para o Senhor morremos. Quer vivamos quer morramos, pertencemos ao Senhor» (Rm 14, 8). É nesta pertença a Cristo que queremos contemplar a vida do nosso irmão sacerdote.
Gostaria de sublinhar três notas da sua vida e ministério, que são também sinais do caminho de santidade ao qual todos somos chamados.
4. Em primeiro lugar, o Padre Robson nutria um profundo amor pela Palavra de Deus. Foi nela que encontrou alimento diário, nela que escutou a voz de Cristo, nela que sustentou a sua oração e a sua pregação. Como discípulo fiel, ensinava-nos que a Palavra não é letra morta, mas fonte de vida e de esperança. Hoje damos graças porque foi, para tantos, mestre de escuta e testemunha do Evangelho vivido.
Na Palavra de Deus podemos escutar a voz do Senhor, se abrirmos não só os ouvidos, também eles, mas sobretudo o coração. O Padre Robson foi mestre em preparar corações para acolher esta Palavra. Palavra decisiva, que oferece à vida um novo rumo, o rumo da eternidade e da plenitude. Por isso, a palavra que hoje escutamos, neste momento, recorda-nos que não fomos feitos para a morte, mas para a vida. A vida eterna!
5. Em segundo lugar, quem conheceu o Padre Robson sabe bem a sua dedicação ao ministério sacerdotal. Preparava com zelo a liturgia, cuidava dos sacramentos, visitava as famílias, acompanhava os jovens, escutava os idosos. Era um pastor que tinha cheiro a ovelha, porque não se poupava a esforços para estar no meio do seu povo. Muitos recordam como o Padre Robson se dedicava de alma e coração a tudo o que estava ao serviço das paróquias em que serviu.
A sua vida sacerdotal foi dom generoso, oferecido até ao fim. Mesmo nesta morta que a todos nos surpreendeu, quando vivíamos o Dia do Senhor, o Domingo, vimos como toda a obra de evangelização que ele realizou apontava para a Ressurreição. A sua vida foi um autêntico ministério da alegria de Deus em nós, daquela alegria da qual pedimos e esperamos que ele seja agora participante.
6. Por fim, em terceiro lugar, o Evangelho esteve sempre no centro do seu olhar para os mais frágeis. O Padre Robson tinha uma atenção concreta pelos pobres, pelos que passavam dificuldades, pelos esquecidos da sociedade. Neles reconhecia o rosto de Cristo sofredor. Ainda há poucas semanas tive a oportunidade de com ele visitar um bairro para escutar as preocupações dos mais frágeis da sociedade.
No silêncio e na discrição, muitas vezes sem ninguém saber, foi para eles presença de caridade e de esperança. Conhecia-os pelo nome. Os seus rostos não lhe eram estranhos porque o pastor conhece as suas ovelhas e o Padre Robson foi uma imagem viva e forte desta caridade de Cristo, Bom Pastor.
7. Queridos irmãos: ao recordarmos estes traços, não fazemos apenas memória de um passado. Reconhecemos a obra que Deus realizou na vida do Padre Robson e damos graças a Deus. A sua morte não é um ponto final: é passagem, é encontro com a plenitude, é entrega nas mãos do Pai que o chamou a ser sacerdote para sempre.
Rezemos para que o Senhor o acolha na festa eterna, onde já não haverá luto, nem dor, nem lágrimas. E peçamos também que nós, ainda a caminho, saibamos viver inspirados no seu testemunho: amando a Palavra, servindo com generosidade e cuidando dos mais frágeis.
Assim, também a nossa morte, quando chegar, será o encontro com Aquele que é a Vida e a Plenitude. Amen.
Igreja de São João de Deus, 22 de agosto de 2025
† RUI, Patriarca de Lisboa
[1] “Ele falava do ponto de vista da eternidade, mas vós o entendestes segundo o tempo.” Assim se exprimia J. Taulero sobre Mestre Eckhart no sermão Clarifica me, pater charitatis,
[2] Referimo-nos ao poeta José Gomes Ferreira e ao seu poema Penso nos Outros
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