Lisboa |
Ordenações Sacerdotais e Diaconais neste Domingo, 29 de junho
Os 7 novos padres do Patriarcado de Lisboa
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O Patriarca de Lisboa, D. Rui Valério, vai presidir à ordenação de sete novos padres e dois novos diáconos com vista ao sacerdócio, no próximo Domingo, dia 29 de junho, Solenidade de São Pedro e São Paulo, na Igreja de São Vicente Fora, em Lisboa, às 16h00. Conheça a história de vida e de vocação de cada um dos sete futuros padres da diocese.

Na celebração, é esperada a ordenação sacerdotal dos diáconos Francisco Costa Alves (São João de Deus), Francisco Moutinho (Portela), Isaac Penha (Óbidos), João Ribeiro (Peniche) e Simão Cruz Ferreira (São Julião da Barra), todos alunos do Seminário Maior de Cristo-Rei dos Olivais. Do Seminário ‘Redemptoris Mater’ Nossa Senhora de Fátima, em Caneças, vão também ser ordenados presbíteros os diáconos Marcin Sek (Polónia) e Tiago Agostinho (Brandoa).

Com ânimo de ascender ao presbiterado, vão ser ordenados diáconos os alunos Afonso Sampaio Soares (Santa Joana, Princesa) e António Lopes (Benedita), ambos do Seminário dos Olivais.

Na noite de dia 27 de junho, sexta-feira, pelas 21h30, vai ter lugar a Vigília de Oração pelos ordinandos, no Seminário dos Olivais, presidida por D. Alexandre Palma, Bispo Auxiliar de Lisboa.

Organizada pelo Serviço de Animação Vocacional, a vigília é aberta a todos os que queiram participar.

 

Diácono Francisco Costa Alves: “Vale a pena confiar. Vale a pena entregar tudo a Cristo”

A poucos dias de ser ordenado sacerdote para o Patriarcado de Lisboa, o diácono Francisco Costa Alves, de 24 anos, partilha o seu percurso vocacional, marcado por uma educação cristã sólida, um chamamento precoce, um tempo fecundo no seminário e uma expectativa de servir como “um padre de esperança”.

A base do seu caminho de fé foi lançada desde cedo no ambiente familiar. “Sempre vivi numa família cristã. Em casa rezávamos, íamos à Missa ao Domingo, e falava-se de Jesus com naturalidade”, recorda Francisco, natural de Lisboa e batizado na Paróquia de São João de Deus. Não sendo “muito efusiva”, a educação cristã que recebeu foi constante e consistente, transmitindo-lhe, desde novo, que Jesus era “um amigo, alguém especial, com quem se podia falar”.

Esse ambiente ajudou-o a integrar facilmente a catequese – primeiro no Colégio São João de Brito e depois na paróquia – e a assumir cedo o serviço litúrgico como acólito e a participação nos escuteiros. Foram experiências que alimentaram a sua fé e abriram caminho a uma descoberta vocacional precoce.

A vocação ao sacerdócio começou a despontar por volta dos 10 anos. “Comecei a perceber que gostava muito de acolitar e, na minha cabeça de miúdo, perguntava-me: ‘Se gosto tanto disto, porque não acolitar para sempre?’”, conta. Mas a inquietação ganhou profundidade após uma conversa com o Padre José Miguel, então diretor do Pré-Seminário: “Ele perguntou-me: ‘Já perguntaste a Jesus o que é que Ele quer para ti?’ E aquilo mexeu muito comigo. Percebi que Jesus não era só alguém de quem me falavam, mas alguém com quem eu podia falar.”

Francisco Costa Alves ingressou no Pré-Seminário de Lisboa com apenas 11 anos e, a partir daí, fez um caminho de discernimento progressivo. “Não consigo apontar um momento específico em que percebi a vocação. Foi uma descoberta gradual, feita de pequenos sinais, de escuta e acompanhamento”, afirma.

A experiência da Jornada Mundial da Juventude de Cracóvia, em 2016, foi especialmente marcante: “Estava numa fase difícil, cheio de dúvidas. O Papa Francisco disse: ‘Jesus é o Senhor do risco’. E eu senti que aquelas palavras eram para mim”.

Francisco entrou no Seminário de Penafirme no 11.º ano e prosseguiu a formação em Caparide, no Ano Propedêutico, e depois no Seminário dos Olivais, onde passou os últimos seis anos. “Foram anos muito diferentes entre si, com alegrias, lutas, algumas tristezas e tensões. Foi um tempo muito diferente do que imaginei. Tive de aprender a viver com outros, a ser irmão entre irmãos. Foi uma verdadeira escola de humanidade, de afetos, de comunhão”, resume.

A vida comunitária, a direção espiritual e o ritmo da oração ajudaram-no a amadurecer a decisão e a integrar melhor os desafios da vida. “Foi importante perceber que a vocação não depende apenas do que sentimos. A entrega a Deus tem de ser uma decisão livre e confiante”, assinala este jovem diácono.

Durante o tempo de seminário, Francisco sentiu-se chamado a viver com um coração aberto e atento às necessidades dos outros: “Aprendi que o padre tem de ser um homem do povo, próximo das alegrias e das dores de todos. Não está acima, está ao lado”.

Ao olhar para o futuro, Francisco assume com esperança e humildade a missão que o espera. “Desejo ser um padre disponível, simples, amigo de Jesus e dos irmãos. Quero viver com um coração universal, atento ao concreto das pessoas, e anunciar o Evangelho com alegria”, deseja.

A poucos dias da ordenação sacerdotal, o diácono Francisco Costa Alves, aluno do Seminário dos Olivais, sente-se sereno e confiante: “Vale a pena confiar. Vale a pena entregar tudo a Cristo. O Senhor tem sido fiel e conduz-me passo a passo”. Por isso, tem “rezado muito” a “necessidade de ser um sinal de esperança, um padre de esperança”. “Seja porque vamos ser ordenados no ano jubilar da esperança, seja porque este nosso mundo, quando olhamos à volta, vemos muitos conflitos, muitas clivagens, um mundo muito polarizado. Vejo o Senhor a querer oferecer ao mundo, através da Igreja, um lugar de paz, um lugar de comunhão e um lugar de esperança. Deus ama muito o mundo e não nos abandona”, garante este futuro padre.

 

 


 

Diácono Francisco Moutinho: “Quero ser um padre próximo, que conhece as pessoas e as escuta”

Jovem da Paróquia da Portela, o diácono Francisco Moutinho, de 24 anos, vai ser ordenado sacerdote no próximo Domingo, 29 de junho, com o desejo de viver um ministério marcado pela proximidade.

Cresceu numa família católica, “aqui ao lado do Seminário dos Olivais”, como conta, e desde cedo teve contacto com a vida paroquial: “Fui sempre à catequese, à Missa de Domingo com os meus pais e irmãos. Era o normal, nunca foi algo imposto, mas uma coisa nossa, de família. Por outro lado, o meu pai é diácono permanente e lembro-me, desde pequeno, de vir ao seminário”.

Foi no Natal de 2011, com apenas 11 anos, que entrou no Pré-Seminário, depois de um convite do Padre José Miguel. “Na altura, o que mais me atraía eram as amizades, os jogos, o convívio com gente da minha idade vinda de toda a diocese”, recorda. “Mas foi aí, talvez até mais do que na catequese, que comecei a conhecer a fundo esta pessoa que é Jesus Cristo e que me traz felicidade. Foi ali que comecei a conhecer Jesus a sério, a fazer perguntas que antes nem me tinha lembrado de fazer”, acrescenta.

Apesar do envolvimento na vida da Igreja, a vocação sacerdotal não era evidente. “Durante muito tempo, dizia que estava aberto à possibilidade de ser padre, mas era mais para agradar às pessoas do que uma coisa convicta. Na verdade, não queria muito pensar nisso. Era mais para parecer bem do que uma convicção real”, admite.

Vários convites para entrar no seminário menor foram surgindo, e Francisco foi amadurecendo lentamente a resposta. “Percebi que entrar no seminário não era um compromisso vitalício. Como dizia o Padre Rui de Jesus, o seminário não é uma fábrica de chouriços. Não é porque se entra que se sai padre. É um caminho de discernimento”, assinala.

A entrada no Seminário Menor de Nossa Senhora da Graça de Penafirme deu-se no 12.º ano: “Foi um ano muito bom. Aprendi a viver com mais autonomia, a estudar por minha conta, a rezar com um ritmo mais estável. Mas, sobretudo, a viver em comunidade. Se eu não lavava a minha loiça, alguém tinha de o fazer por mim. E isso ensina-nos muito”.

Mais tarde, no Ano Propedêutico no Seminário de Caparide, aprofundou o autoconhecimento e começou a prestar mais atenção ao ministério dos padres. “Mais do que gostar de ser padre, comecei a gostar de fazer coisas de padre. Acompanhar as pessoas, ouvir as suas histórias, estar com elas nas alegrias e nas dores… isso começou a fazer sentido para mim, a entusiasmar-me. Vi padres felizes a fazer isso, e quis imitá-los”, partilha.

A passagem para o Seminário dos Olivais trouxe um novo desafio: fazer desta nova casa, casa própria. E foi já adiantado no percurso formativo que surgiu o grande ponto de viragem: “Foi na passagem do terceiro para o quarto ano. Comecei a questionar-me seriamente: ‘É mesmo isto que quero para a vida?’ Via casais com filhos, e aquilo também me tocava. Reconheci a beleza dessa vocação. Tinha dúvidas reais, mas percebi que não era por aí que Deus me chamava”.

Foi então que se deu o verdadeiro discernimento. “Percebi que não era por falta de amor ao casamento, mas porque sentia um apelo diferente. Sinto-me chamado a um amor mais universal, mais abrangente. A dar-me a todos”, concretiza.

O contacto com os sacerdotes foi-se aprofundando com as experiências pastorais em diversas comunidades: Algés-Miraflores, Cruz Quebrada, Olivais Sul e Santa Maria dos Olivais. “Aprendi que a pastoral não se faz sozinho. Aprendi com os padres com quem vivi e com as pessoas que me acolheram”, refere.

E sublinha: “Quando o padre conhece o nome das pessoas, a história delas, isso muda tudo. Há uma grande diferença entre tratar alguém por ‘senhora’ ou dizer ‘dona Fernanda’”.

Questionado sobre que tipo de padre quer ser, Francisco responde sem hesitação: “Quero ser um padre que está. Mais do que organizar mil atividades, o que importa é estar com as pessoas, saber delas, escutá-las”. Contudo, reconhece que esse ideal nem sempre é fácil de cumprir. “Há sempre muita coisa para fazer, muitas solicitações. Mas se o padre coloca distância, se se fecha, perde-se uma parte essencial do ministério. A proximidade é tudo”, garante.

Com a ordenação à porta, o diácono Francisco Moutinho vive estes dias com uma mistura de emoções. “Sinto alegria, gratidão, paz. Mas também algum receio. Uma paróquia nova, pessoas novas… como vai ser? Como me vou inserir?”, questiona-se. Apesar das incertezas, a confiança prevalece: “Ao longo destes anos, fui percebendo que Jesus podia estar comigo neste caminho. Essa presença foi dando coragem para continuar a dizer sim, mesmo quando não tinha tudo claro”.

Com os olhos postos na ordenação presbiteral, este aluno do Seminário dos Olivais partilha os seus desejos e receios: “A principal expectativa é poder viver um ministério próximo. Estar com as pessoas, ser presença, não apenas uma figura. Se o padre coloca distância, metade do trabalho fica comprometido.”

Há uma certeza que se mantém desde o primeiro passo do futuro Padre Francisco Moutinho: “Jesus está comigo neste caminho do sacerdócio. Foi isso que me foi dando coragem para continuar a dizer sim”. E conclui: “A grande aprendizagem do seminário foi esta: querer saber das pessoas e estar próximo. Se conseguir viver o sacerdócio com esta verdade, então valeu a pena”.

 




 

Diácono Isaac Penha: “Que Deus me mantenha firme e fiel ao que me pede”

Sonhou andar no mundo do cinema, mas agora o seu ‘filme’ é o da vida real e concreta de cada pessoa. Com 34 anos, o diácono Isaac Penha, da Paróquia de Óbidos, prepara-se para a ordenação sacerdotal após um caminho marcado pela “experiência do sofrimento e a redescoberta da beleza”. O desejo é o de ser “um pai espiritual”.

Isaac Penha, natural da Paróquia de São Pedro e Santa Maria de Óbidos, cresceu no seio de uma família católica, em que a fé fez parte do seu dia a dia desde a infância: “Não me lembro de passar a conhecer Jesus. Foi uma coisa que esteve sempre presente. Desde que ganhei memória ou consciência, Ele já estava lá”. A oração em família marcou profundamente a sua vivência cristã. “Cresci numa família católica, rezava em pequeno, lembro-me de estar com os meus pais a rezar... durante o mês de maio e de outubro íamos rezar o terço à igreja”, conta.

Isaac frequentou a catequese de forma contínua, e o serviço ao altar surgiu muito cedo, “ainda antes da Primeira Comunhão”, aos sete anos. A ligação à paróquia foi sempre muito viva, combinando a prática doméstica com a vida comunitária: “Estive sempre envolvido, sempre na catequese, a rezar sempre. Foi em casa a educação, e depois era o complemento da paróquia”. A fé sempre foi vivida como um compromisso contínuo. “Mantive essa prática cristã até ao Crisma, que fiz já no Seminário Menor”, refere.

Isaac começou o seu caminho vocacional muito cedo, aos 12 anos, quando foi convidado pelo seu pároco, o Padre José Luís Guerreiro, para participar no Pré-Seminário. “Eu disse que sim porque era o padre a convidar-me para uma coisa”, recorda, sublinhando que este sacerdote “tinha uma atenção muito especial aos rapazes” e fomentava o surgimento de vocações na paróquia: “Houve uma altura em que a paróquia chegou a ter algumas vocações por causa dessa atenção dele”.

Essa primeira experiência foi vivida no verão, com muita alegria: “Havia Santa Missa todos os dias, oração, catequese e imensa brincadeira, praia e futebol – o futebol convenceu-me também!” No final da semana, foi convidado a participar nos encontros mensais do Pré-Seminário. “Disse que sim. A Igreja chamava, Deus queria, vamos”. Assim, iniciou um percurso de discernimento gradual, sempre a responder ‘sim’, ainda que pouco consciente e refletido: “Era uma coisa um bocadinho unilateral, eu aceitava, mas não pensava muito sobre o assunto. Sentia-me bem ali, gostava de Jesus, gostava daquilo que fazíamos, mas não era uma decisão muito rezada ou refletida”.

Foram cinco anos no Pré-Seminário, até que, aos 18 anos, entrou no Seminário Menor em Penafirme, depois de insistentes convites, mesmo contra a vontade da mãe, que inicialmente lhe proibiu a entrada. “Eu disse que já tinha 18 anos e que queria ir. Eu decidi que queria”. Foi também nessa fase que começou a pensar pela primeira vez com mais seriedade: “Só em Caparide comecei a pensar mesmo ‘isto é para ser padre, é o meu caminho’”.

No entanto, essa certeza não foi linear. No Seminário de Caparide, começou o Ano Propedêutico, mas pouco depois sentiu-se inseguro e saiu, em dezembro de 2012: “Comecei a questionar-me pela primeira vez o que é que eu realmente queria. Será que é ser padre? Gostava de ter uma família, ser artista… Comecei a pensar muito mais no que eu queria do que no que Deus queria”. Essa fase representou uma viragem no seu percurso. “Passei a pensar mais no que eu queria para a minha vida, e percebi que não era aquilo. Na altura não sabia bem… Senti que não era o tempo”, conta.

Durante cinco anos, até 2017, Isaac esteve fora do seminário e mergulhou nas artes, uma paixão de infância que sempre o acompanhou. “Desde pequeno gostava muito de desenhar e pintar. Fiz artes visuais na escola e depois fiz cinema na Escola Superior de Artes e Design nas Caldas da Rainha”, lembra. Apaixonou-se pelo cinema, chegando mesmo a trabalhar numa produtora, e sentiu-se feliz e realizado. Contudo, a prática cristã não desapareceu totalmente: “Ia à Missa ao Domingo, até tocava órgão e era maestro em três paróquias. Mas a oração pessoal diminuiu muito e passei um período de meses sem rezar, só cumpria o serviço”.

Esse tempo de afastamento trouxe consigo dúvidas, um período de namoro e até noivado, mas também um vazio interior. “Fiz coisas que nunca tinha feito antes, vivi um tempo de pecado mais grave. Sentia-me feliz por um lado, mas havia uma insatisfação que não sabia explicar”, partilha. Um exercício na escola de cinema fê-lo perceber que já fora mais feliz do que naquele tempo: “Comecei a ter saudades daquela felicidade de antes, daquela vida no seminário, com tanta gente, alegria e sentido”.

Depois daquele período de afastamento e dúvidas, e antes de entrar novamente no seminário, aconteceram “duas realidades” muito importantes que Deus usou para chamar de novo Isaac e mostrar o caminho para onde sempre o tinha chamado: “a realidade do sofrimento e a realidade da beleza”.

“No sofrimento, vivi um momento difícil. Mesmo no período do namoro, comecei a sentir um desejo de experimentar a felicidade ligada ao prazer. Recordo-me de duas situações marcantes: em encontros com duas raparigas diferentes, ambas começaram a desabafar comigo as suas dores, as suas vidas difíceis, choraram à minha frente e eu senti uma profunda compaixão. Fiquei confuso, mas também tocado pela fragilidade e sofrimento delas. Esses momentos levaram-me a perceber algo fundamental: eu não podia amar verdadeiramente todas essas pessoas da forma que elas precisavam, nem o amor matrimonial era suficiente para responder às dores e necessidades profundas delas. Comecei a refletir sobre o tipo de amor que poderia dar e que elas precisavam – percebi que era um amor diferente do amor humano, um amor que só Deus pode dar. Esse foi o início de um novo discernimento, uma consciência de que a vida consagrada podia ser o caminho para amar de forma mais plena e verdadeira”, testemunha.

Paralelamente, “a beleza também começou a ter um peso grande” na sua vida. “Na escola de cinema, procurava a grande beleza, a verdadeira beleza, que justifica a vida e que quero servir através da arte. Recordo-me de um filme italiano, ‘La Grande Bellezza’, que me marcou muito. Também numa viagem a Itália, aproveitando um projeto artístico com estudantes de cinema, fui a Veneza e decidi entrar na Missa numa igreja antiga, celebrada segundo o rito tradicional. A beleza da liturgia, da arquitetura, da música, da oração em silêncio, tocou-me profundamente. Ali encontrei Deus – a beleza que eu tanto procurava. Foi uma experiência decisiva, uma revelação de que Deus é a beleza perfeita e a resposta para a minha busca”, frisa. “Depois disso, comecei a rezar novamente, mesmo que aos poucos. Recomecei a rezar o terço, a confessar-me, a buscar Deus com um coração renovado”, acrescenta.

Hoje, o diácono Isaac assume que “estas experiências do sofrimento partilhado e da descoberta da beleza divina foram fundamentais” para o “chamar de volta e para perceber” que a sua vocação “era mesmo a vida consagrada, a entrega total a Deus”.

Em 2016, durante o Ano Santo da Misericórdia, Isaac Penha viveu um momento decisivo de reencontro com Deus: “Comecei a frequentar com regularidade a adoração ao Santíssimo Sacramento e a confessar-me semanalmente. Este hábito foi transformador para a minha vida espiritual.” No início, confessa, “sentia-me até com alguma revolta, questionando como Deus me podia amar tanto apesar das minhas falhas e pecados”. O reencontro com o Padre Ricardo Figueiredo, que já conhecia do tempo do seminário, foi providencial: “Após uma confissão profunda onde derramei muitas lágrimas e confessei os meus maiores erros, senti que precisava entregar-me completamente à Igreja”. Com a ajuda deste sacerdote, que se tornou seu diretor espiritual, estruturou uma vida nova: “Com Missa diária, terço, meditação e silêncio.” Ainda ligado ao mundo do cinema, conta que um produtor com quem trabalhou “compreendeu a importância de Deus” na sua vida e apoiou-o para “conciliar trabalho e fé”. A consciência do chamamento tornou-se mais clara: “Compreendi que Deus nunca me afastou. Era um regresso, um reencontro com o caminho para onde Ele sempre me chamou”.

Por muito que pensasse que não voltaria, a voz de Deus nunca se calou. Em 2017, cinco anos após a saída, Isaac decidiu regressar ao seminário, desta vez com uma decisão consciente e amadurecida: “Desta vez foi mais pensado, mais rezado. Já não era só porque a Igreja chamava, era porque eu queria mesmo. Sinto que Deus foi paciente comigo… E eu fui percebendo que, apesar das pausas, Ele não desistia”.

Aluno do Seminário dos Olivais, Isaac fala abertamente do seu percurso no Seminário Maior, marcado por dúvidas, resistência familiar e também pela certeza de um chamamento que se foi clarificando com o tempo: “Quando voltei ao seminário já foi com uma certeza, ou pelo menos com uma resposta consciente, de querer o que Deus quer. Se Deus quiser que eu seja padre, ótimo, porque também tenho esse desejo de me entregar”.

Para Isaac, o seminário foi muito mais do que formação, foi um verdadeiro combate espiritual. “O seminário foi um campo de batalha. Tive as minhas fraquezas, os meus pecados. Foi um tempo de crescimento, purificação, humildade, de deixar Deus converter o meu coração. O demónio existe mesmo e não quer padres”, alerta, recordando as tentações que enfrentou: “Ele tenta os seminaristas a não seguir este caminho, a não sermos santos, a desleixarmo-nos”.

As dificuldades foram reais, incluindo um pedido de espera da Igreja na fase de ser instituído acólito e leitor, o que foi um grande sofrimento para Isaac. “Foi assim um tempo difícil, mas de crescimento e de confirmação da vocação. A Igreja foi-me confirmando depois ao longo do tempo, e hoje sou diácono, quase sacerdote”, frisa.

O apoio familiar foi fundamental, não só do pai, que é diácono permanente, mas também da mãe, que inicialmente reagiu com silêncio, mas que acabou por apoiar e abraçar o chamamento do filho: “Quando voltei ao seminário, falar do seminário com a minha mãe foi totalmente diferente da primeira vez. Ela começou a ir à catequese de adultos, foi um percurso bonito em família”.

Isaac olha para o futuro com humildade e confiança na graça de Deus: “Espero que Deus me dê sempre a sua graça e que me mantenha firme e fiel ao que Ele me pede”. O seu desejo é servir de forma autêntica e próxima do exemplo de Cristo. “Quero ser um sacerdote como Jesus, ao jeito de Jesus, um ‘Alter Christus’, que em latim significa ‘outro Cristo’”, deseja.

Para ele, o ministério é uma entrega total: “Quero viver tudo, seja o que for, para fazer na paróquia o serviço que for preciso, para maior glória de Deus e para a salvação das almas”. Isaac deseja que o seu ministério seja fonte de vida para os outros. “Quero dar a vida pelas pessoas, dar-lhes a vida divina pelos sacramentos, alimentar com a Eucaristia, que é a melhor coisa do mundo, perdoar-lhes os pecados, dar o amor misericordioso de Deus, tal como eu recebi e que mudou a minha vida”, diz.

A experiência como diácono tem-lhe dado uma perspetiva profunda da missão: “Tenho imensas pessoas a abordarem-me na rua, até desconhecidos. Já tive experiências extraordinárias de pessoas que me vêm pôr a vida nas minhas mãos, esperando uma resposta que mude as suas vidas”.

O futuro Padre Isaac Penha sente-se, por isso, chamado a ser um guia espiritual próximo e dedicado: “Quero dar a graça de Deus pelos sacramentos, pelo acompanhamento, pela amizade, sendo um pai espiritual, sendo um padre. É isso que eu espero para o futuro”.

 

 


 

Diácono João Ribeiro: “Ser rosto de Jesus no mundo de hoje. Um rosto que escuta, que abraça, que permanece”

Aos 27 anos, o diácono João Ribeiro prepara-se para ser ordenado sacerdote. Natural de Peniche, cresceu num ambiente cristão marcado pelo exemplo dos avós, viveu um afastamento da fé na adolescência e reencontrou-se com Deus num retiro de acólitos. Ao longo da caminhada vocacional, descobriu-se amado e superou o vício dos jogos de computador. Hoje, deseja apenas “levar Jesus às pessoas”.

João cresceu na Paróquia de São Pedro, em Peniche, onde desde cedo foi introduzido à vida da Igreja. “A grande influência foram os meus avós paternos. Íamos sempre à Missa ao Domingo, era um hábito, mas era mais do que isso”, conta. Aos 8 anos começou a ser acólito. “Foi através dos acólitos que conheci Jesus. Não era só o serviço litúrgico, no altar: fazíamos retiros, atividades, peregrinações, caminhadas. Aquilo era uma verdadeira comunidade de fé. Senti-me mesmo parte da Igreja”. João recorda especialmente uma caminhada a Fátima. “Tinha 11 ou 12 anos. Fomos todos juntos de mochila às costas. Dormíamos no chão de ginásios. E mesmo no meio do cansaço, sentia uma alegria enorme. Hoje percebo que ali Deus já me ia falando”, frisa.

O avô, que o levava sempre à Missa, foi uma figura essencial. “O meu avô era o meu herói. Via-o como alguém muito firme na fé, mas também muito humilde. Foi o meu primeiro educador na fé. Os meus pais não iam muito à Missa, mas os meus avós iam sempre. E eu ia com eles”, recorda.

Na adolescência, porém, veio o afastamento. “Aos 16 anos, disse à minha avó que não queria ir mais à Missa. Ela chorou. Mas eu estava farto de fazer aquilo porque sim. Sentia-me a viver uma fé por obrigação, não por convicção. Sentia-me obrigado e parei”, relata. O afastamento durou cerca de dois anos. “Deixei tudo: Missa, oração, grupo de acólitos. E comecei a fechar-me muito em mim. Jogava no computador horas e horas. Aquilo era o meu refúgio. Os jogos eram o meu mundo. No jogo sentia-me bom, reconhecido, útil. Mas depois... vinha sempre um vazio enorme. Uma tristeza que não sabia explicar”, testemunha.

A grande viragem aconteceu num retiro de acólitos, que decidiu frequentar quase por acaso. “Nem ia com vontade. Mas lembro-me bem de um momento de adoração ao Santíssimo, com todos em silêncio. Comecei a chorar descontroladamente. Não conseguia parar. Foi como se Jesus me dissesse: ‘Eu estou aqui. Eu vejo-te. Tu não estás sozinho’. Esse momento ficou gravado em mim. Fiquei muito baralhado, mas também com vontade de voltar”, assume.

Apesar do regresso à prática religiosa, João Ribeiro vivia uma luta interior marcada pela dependência do mundo digital. “Passava imensas horas no computador, fugia do sofrimento da vida real. Sentia-me bem no momento, mas depois vinha sempre uma tristeza enorme. Não sabia o que queria da vida”, relata. Apesar desse toque de Deus, a vida de João continuava marcada por instabilidade. Tentou dois cursos universitários – Turismo e depois Comunicação – mas acabou por desistir de ambos. “Estava mesmo perdido. Sentia-me sem rumo, sem alegria, sem saber o que queria da vida”, garante.

Foi nesse tempo que conheceu as Irmãs da Aliança de Santa Maria. “Fui a uma celebração onde estavam presentes. Olhei para elas e pensei: ‘Estas mulheres têm tão pouco, mas estão tão felizes. O que é que eu tenho e não tenho que elas têm?’ Aquilo mexeu comigo. Eu, com tudo o que achava que me dava felicidade, estava sempre triste. Isso abalou-me”, reconhece.

O jovem João começa então a ir a encontros organizados pelas religiosas e, aos poucos, foi-se abrindo à ideia de vocação: “Houve um dia em que, no final de um encontro, uma irmã se virou para mim e disse: ‘João, se calhar Deus quer algo de ti’. Aquilo ficou-me a ecoar por dentro durante semanas. Comecei a pensar: ‘E se Deus quiser algo de mim? E se este vazio só se preencher com Ele?’”.

Após falar com o seu pároco de então, o Padre Diogo Correia, João Ribeiro participa na semana de verão de Penafirme, onde se sentiu “muito bem acolhido” e “em casa”. Começou então a ser acompanhado espiritualmente por um sacerdote e, em 2018, tomou a decisão de entrar no Ano Propedêutico, no Seminário de Caparide. “Tinha medo, claro. Mas sentia dentro de mim uma paz nova, diferente de todas as outras. Pela primeira vez, senti que podia confiar totalmente em Deus”, manifesta.

A entrada no seminário foi um tempo de grandes descobertas. “O Propedêutico, para mim, foi dos anos – se não o ano – mais felizes da minha vida. Enfrentei coisas do passado que tinha varrido para debaixo do tapete: a morte do meu avô de que nunca tinha feito luto, mágoas familiares, medos antigos. Mas nesse confronto com a minha fragilidade, descobri algo fundamental: Deus ama-me como sou. Não como eu gostava de ser, mas como sou. Isso libertou-me”, refere.

A experiência de comunidade foi determinante: “Foi a primeira vez que senti que não precisava de ser perfeito para ser amado. E que a minha história não era um obstáculo, mas o lugar onde Deus queria entrar”.

Nos anos seguintes, já no Seminário dos Olivais, o caminho continuou a amadurecer, tendo aprofundado essa descoberta. “Foi um tempo de reencontro comigo mesmo. Houve alturas em que quis desistir, mas Deus nunca desistiu de mim. Aprendi a rezar de verdade, a escutar, a discernir. A liturgia aqui tocou-me muito. A beleza, o silêncio, os gestos... tudo me ajudava a estar mais perto de Deus”, conta.

João destaca também a importância da fraternidade com os colegas seminaristas. “A vida comunitária nem sempre é fácil, mas é profundamente humana. Aprendi muito a acolher o outro e a deixar-me acolher. Houve momentos em que estava em crise e foram os meus irmãos de caminhada que me sustentaram e me seguraram quando eu já não conseguia”, revela.

A relação com os pais também se foi curando. “O meu pai teve dificuldades em aceitar. Dizia-me: ‘Tens tantas capacidades, vais desperdiçar isso na Igreja?’. Mas hoje percebe que esta é a minha alegria. E a minha mãe, que chorou quando lhe disse que ia para o seminário, agora diz-me: ‘Nunca te vi tão sereno, tão feliz’”, partilha.

Hoje, às portas da ordenação sacerdotal, este jovem aluno do Seminário dos Olivais sente-se em paz, com o coração cheio de esperança, e olha para a sua história com gratidão: “Se Deus me chamou, foi também por tudo o que vivi. Ele entrou no meu caos e transformou-o”.

Em vésperas da ordenação, o futuro Padre João Ribeiro sente-se tranquilo e confiante, e resume o desejo profundo que o anima: “Estou em paz. Sinto que é isto. Sinto-me enviado. Quero levar a presença d’Ele aos outros, como outros a levaram a mim. Quero ser também rosto de Jesus no mundo de hoje. Um rosto que escuta, que abraça, que permanece. E se puder ser isso, então valeu a pena tudo o que vivi”.

 

 


 

Diácono Marcin Sek: “Mostrar somente que Deus ama-nos muito”

O diácono Marcin Sek, natural de Varsóvia, na Polónia, tem 55 anos e será ordenado padre, neste Domingo, para o Patriarcado de Lisboa. Veio para Portugal em 2012, enviado para o Seminário ‘Redemptoris Mater’, em Caneças, no âmbito do Caminho Neocatecumenal. Treze anos depois, quer apenas ser instrumento da misericórdia de Deus e “levar a morte e ressurreição de Cristo para os outros”.

Desde pequeno, Marcin foi envolvido numa vivência cristã assídua: “Desde a Primeira Comunhão, comecei praticamente a, cada dia, ir para a Eucaristia. Com 9, 10 anos”. A sua formação inicial foi acompanhada por padres diocesanos na Polónia. Embora os pais não fizessem parte de movimentos eclesiais, a fé era vivida com naturalidade. “Íamos à Missa e eu andava na catequese”, recorda.

Aos 15 anos, integrou o grupo de jovens Oásis, da paróquia em Varsóvia, e assim começou um caminho mais pessoal de descoberta espiritual. Mesmo sem pertencer a nenhuma congregação ou seminário na juventude, o desejo de seguir o Senhor era grande. “Olhando agora para trás, vejo que Deus me chamou quando eu estava na escola”, considera.

A vocação de Marcin amadureceu lentamente, entre tentativas e esperas. Após terminar o ensino secundário, recusou estudar por mera obrigação. “Para mim, estudar, precisava gostar imenso de uma matéria. Não queria estudar somente para ter diploma”, refere. Começou então a trabalhar com o pai, numa oficina de pneus, vida que manteve até quase aos 40 anos.

Fez duas experiências marcantes com os exercícios espirituais dos jesuítas e iniciou um curso de organista após um convite inesperado: “Uma freira pediu-me para cantar, porque o padre perdeu a voz. E desafiou-me a fazer o curso de organista”.

Durante dez anos tocou numa paróquia na Polónia. Mas o grande ponto de viragem surgiu aos 38 anos, através do Caminho Neocatecumenal, por meio de um convite que lhe chegou de forma muito simples, através da sua ex-namorada. “Recebi uma mensagem sobre catequeses. Fui para lá. Procurava um grupo para caminhar para o Senhor, porque caminhar sozinho é muito difícil”, observa.

Foi numa celebração penitencial que escutou as palavras que mudariam a sua perceção do amor de Deus: “Deus ama-me como eu sou”. E recorda: “Eu pensava que, para ser amado, precisava fazer alguma coisa da minha parte. Isto marcou-me muito”.

Dois anos depois, leu o início do livro de Isaías: «Quem posso enviar para lá?», e sentiu-se interpelado: “Levantei-me. Foi em 2011, depois da Jornada Mundial da Juventude de Madrid 2011, numa Eucaristia na Polónia. Eu tinha dúvidas, tinha quase 40 anos, mas quando Deus chama, não importa. Não importa”.

Participou durante um ano em encontros do seminário, e depois, no ano seguinte, foi a Porto San Giorgio, localidade italiana de referência para o Caminho Neocatecumenal, onde os futuros seminaristas são destinados a um Seminário ‘Redemptoris Mater’ de qualquer parte do mundo. “Como tenho problemas para aprender línguas, pensava que ia lá para dizer somente que ia continuar no seminário em Varsóvia. Mas não. E fui enviado para Lisboa. Aceita? Aceita!”, conta.

Chegado a Portugal em outubro de 2012, iniciou o curso de Teologia depois de aprender o Português. Frequentou três semestres de língua portuguesa na Faculdade de Letras, confessando que, “mesmo hoje”, ainda tem “problemas com o Português”.

O início no Seminário ‘Redemptoris Mater’, em Caneças, não foi fácil: “Disseram-me: ‘Marcin, tu decides, ficas aqui ou vais para um país com uma língua mais fácil.’ Olhei para esse irmão e respondi: ‘Vou ficar aqui. Não fui eu que escolhi Portugal, nem o Português. Deus não se engana’”, recorda.

O seu tempo de formação incluiu uma missão na Rússia, entre 2022 e 2023, em plena guerra. Foi enviado para o sul da Sibéria, junto ao Cazaquistão. “Fui surpreendido. Mas graças a Deus havia uma paróquia católica, com famílias e padres polacos. Gostei muito. Estou disponível para tudo. Para qualquer sítio. O que o Senhor quiser”, garante.

Realizou também trabalho pastoral em São Martinho do Porto e Alfeizerão, e participou em catequeses na Mouraria: “O padre disse que não percebeu nada, por causa da língua, mas que a gente de lá gostou mais da minha catequese. Não sei como foi... é Deus que fala. É o Espírito Santo que fala. Não eu. Não eu”.

Apesar das dificuldades, concluiu o mestrado em Teologia: “Como é possível? Defendi a tese! Ainda tenho problema com o Português…”

Às vésperas da ordenação, o diácono Marcin Sek vive com simplicidade e gratidão este momento. “Sou pobre”, diz. A sua mãe, falecida em 2020, não estará fisicamente presente, mas Marcin confia: “Vai olhar do Céu”. O pai, o irmão, um primo e alguns membros da sua comunidade de origem virão de Varsóvia para a celebração.

Sobre o futuro, Marcin não tem planos pessoais ambiciosos. Apenas deseja ser instrumento da misericórdia de Deus: “Mostrar somente, porque há gente que não sabe, que Deus ama-nos muito. Levar a morte e ressurreição de Cristo para outros. Mostrar isto. Mais nada”.

 

 


 

Diácono Simão Cruz Ferreira: “Aquele rapaz que nunca se sentiu feliz em muitos sítios, aqui é feliz”

O diácono Simão Cruz Ferreira, de 25 anos, vai ser ordenado padre este Domingo, 29 de junho, após um percurso vocacional marcado por provações, reencontros e uma entrega crescente a Deus. Natural da Paróquia de São Julião da Barra, Simão reconhece: “Não estou aqui porque controlo, mas porque fui amado, escolhido e sustentado”.

Sexto de oito irmãos e “o mais novo durante nove anos, até nascerem as gémeas”, Simão refere que a família “não era daquelas de rezar o terço todos os dias”, mas que “havia sempre Missa ao Domingo e catequese”. Uma das suas tias, irmã da mãe, é consagrada na Ordem da Santa Cruz, o que teve um impacto importante na sua infância: “Íamos visitá-la, as minhas irmãs mais velhas iam fazer retiros de silêncio e vocacionais... Desde pequenino que vi a vocação como uma coisa muito boa, algo que eu tinha de perceber: ‘O que é que Deus queria para mim?’ Mesmo sem falar muito do assunto, o tema da vocação surgia naturalmente”.

Ainda em criança, teve um momento marcante: “O meu prior, o Padre Nuno Westwood, chegou à paróquia e disse, numa das primeiras Missas, que era preciso padres. E eu pensei: ‘Olha, está bem, eu posso ir. Se Deus chama, eu vou’”. Mas nem sempre esse impulso foi claro. Simão admite: “Nunca fui de brincar às Missas, nem de pensar seriamente nessa vocação. E a verdade é que nem gostava muito da catequese”.

A adolescência foi um tempo de provações. “Os meus pais divorciaram-se quando eu tinha uns 10 ou 11 anos, e a pré-adolescência foi um bocado atribulada. Saí da catequese no 8º ano, depois voltei para fazer o Crisma, mas estava a lidar com muitas feridas de amor dos pais. A vocação, nessa altura, não estava muito nos planos”.

Tudo começou a mudar num retiro de catequese, no final do 8º ano. “Foi-nos desafiado fazer uma hora de silêncio para responder à pergunta: ‘Onde é que eu estou daqui a cinco anos?’ E é muito curioso, porque foi exatamente cinco anos depois que entrei no seminário”. A resposta, que parecia apenas uma reflexão, havia de se tornar caminho mais tarde.

Simão partilha que, no início, não queria decidir sobre a sua vida, nem fazer “planos a longo prazo”. Apesar de ter sonhos, como “ter um namoro estável”, sentia resistência à ideia de ser padre.

Durante o 10.º ano, viveu momentos difíceis, como o afastamento do pai, cenário que mudou após o Crisma. Nesse verão, participa num campo de férias que o marcou: “Esse campo de férias foi fundamental para eu perceber que Deus conduzia a minha história e que Deus estava comigo”. Simão percebeu que a sua história podia “tocar outras pessoas” e que Jesus “quer uma relação pessoal... uma relação de santidade a sério”, o que o levou a começar a rezar o terço diariamente.

No 11.º ano, começou a namorar e a pensar no futuro nos Estados Unidos da América, mas conheceu um seminarista que o despertou para o Pré-Seminário. Apesar de estar com tudo planeado para os EUA, sentiu a necessidade de “tirar isto a limpo” e foi participar, refletindo depois sobre “a dinâmica da fidelidade” e a frase que ouviu: “A felicidade dos outros depende da tua fidelidade”.

Já nos EUA, para concluir o secundário, enfrentou dificuldades. A adaptação à nova família de acolhimento foi exigente e sentiu-se deslocado: “Eu não gostava do Simão que eu estava a dar...” Um episódio difícil foi ser apanhado com bebida e ser chamado para regressar a Portugal. “Foi a maior vergonha do mundo”, considera. No entanto, foi possível continuar o ano letivo nos EUA, mas com um novo grupo e uma nova atitude.

Foi em terras americanas que viveu um período de namoro, que o marcou profundamente. “Achei que nunca ia amar ninguém assim. Pensei mesmo: ‘Esta é a mulher da minha vida’”, recorda. Mas o regresso a Portugal para estudar acabou por ditar a separação.

Foi ainda nos EUA, num ambiente pouco familiar à fé católica, que Simão fez uma escolha decisiva: manter-se fiel à Eucaristia dominical, mesmo que isso implicasse ir sozinho, a pé, durante quase uma hora. “Foi um ponto de viragem. Eu sabia que não era um exemplo de vida cristã, mas ir à Missa ao Domingo de manhã era o ‘mínimo olímpico’. Eu sou cristão, e isso é o mínimo”, refere. A fidelidade à Missa, apesar das dificuldades, tornou-se uma âncora no seu caminho de fé.

De volta a Portugal, entrou no Técnico, ainda sem saber bem o que fazer da vida. Queria trabalhar para juntar dinheiro e visitar a antiga namorada, mas o tema da vocação voltava a surgir, agora com mais força. Participou num campo de férias e numa reunião de equipas de jovens onde o tema da vocação o confrontou de forma direta. “Percebi que para mim a questão estava mesmo presente, e que não era assim tão comum nas outras pessoas. Isso fez-me pensar: ‘Tenho de voltar a procurar’”, conta.

Ofereceu-se para dar catequese e acabou por ficar responsável por um grupo de jovens, apesar de nunca ter tido essa experiência: “Não sabia pegar numa Bíblia, não sabia rezar com jovens, mas aceitei”. Ao mesmo tempo, decidiu regressar ao Pré-Seminário, ainda que com algumas reservas pela experiência anterior. “Mandei mensagem ao Padre Rui de Jesus, que não me respondeu logo, mas depois disse: ‘Simão, se queres entrar, é para ser a sério’”, relata. Durante esse ano, começou a ter direção espiritual regular e a participar frequentemente nos encontros.

Já no Seminário de Caparide, algo mudou profundamente: “Percebi que os seminaristas eram pessoas normais, felizes. Tinham deixado trabalhos, estudos, namoradas e estavam ali inteiros, entregues. E eram felizes. Isso mexeu comigo”, garante. Até então, Simão habituara-se a procurar a felicidade no afeto de outra pessoa, em ser amado. Mas ali, naquele ambiente, descobriu algo novo: “Aquele Simão que nunca soube gostar de si próprio… ali começou a gostar. Vi que havia ali verdade, entrega e alegria”.

No meio de tudo isto, tomou uma decisão radical: fazer um ano inteiro de discernimento vocacional sério, assumindo o compromisso de viver a castidade e renunciar a qualquer tipo de relação amorosa. “Talvez tenha sido das coisas mais difíceis que fiz. Mais até do que entrar no seminário”, confidencia. Esse compromisso ajudou-o a ganhar inteligência emocional e a perceber que não podia viver à mercê das emoções.

No final de 2017, Simão começou a sentir que o seminário era o lugar certo para ele: “Em dezembro pensei: ‘Ok, acho que isto é para mim. Não quero ser padre pelo fascínio, mas esta casa é para mim, a vida deles é para mim e quero ser feliz assim’”. Apesar das dúvidas e de ser muito racional, sentiu o chamamento: “Comecei a ver estatísticas e pensei: ‘Só um terço dos que entram são ordenados, se calhar não vale a pena largar tudo…’ Mas depois pensei na figura de Abraão, que todos os dias perguntava: ‘Jesus, hoje chamaste-me aqui, e agora?’”

Em maio desse ano decidiu entrar no seminário e contou à família: “Disse-lhes: ‘É muito provável que vá entrar no seminário’. Eles ficaram surpreendidos, perguntaram se eu tinha certeza e eu respondi: ‘Não tenho certeza, mas acho que Jesus quer e isso basta’”.

No seminário, nesse caminho de discernimento, Simão assume que casar e ter filhos ainda lhe passava pela cabeça: “No final do 1º ano escrevi ao D. Manuel Clemente [então Cardeal-Patriarca de Lisboa] dizendo que, em consciência, tinha de referir que ainda queria casar e ter filhos, mas que Jesus chama e eu sigo”. O 2º ano foi novamente complicado, com dúvidas e uma paixão forte que parecia querer afastá-lo do caminho: “Foi um ano difícil, interiormente complicado, mas os padres disseram-me para ficar e fazer pastoral para amadurecer”.

Simão começou então a fazer trabalho pastoral em Arruda dos Vinhos, o que lhe trouxe um novo olhar sobre o sacerdócio: “Comecei a apaixonar-me pela vida do padre, não só pela Missa, mas por acompanhar pessoas, visitar casas, estar perto delas”. No 4º ano, surgiram novos desafios: “A pastoral começou a ter problemas, a vida no seminário também, comecei a ter medo do futuro e a sentir que poderia voltar a apaixonar-me”. Foi um ano de uma profunda crise interior, marcada pelo medo do futuro e dúvidas sobre a sua própria capacidade e integridade. Mas o apoio do Padre Rui Pedro Carvalho foi decisivo para o ajudar a permanecer: “Ele disse-me: ‘Tu não vais sair. O que tu estás a passar é uma altura de desolação espiritual. Nestes momentos em que ouves mais a voz do tentador do que a voz de Deus, não são alturas para mudar e tomar decisões’. E acabei por ficar’”.

Durante meses, Simão viveu um período difícil, quase de despedida, continuando o trabalho pastoral: “Quase sobrevivi até a desolação passar para poder mostrar que era de facto para sair”.

Um momento decisivo aconteceu numa celebração do Advento, quando leu uma passagem bíblica que lhe trouxe grande consolação: «Eis que uma Virgem conceberá e dará à luz um filho que será chamado Emanuel». Este versículo foi, para ele, uma “luz enorme”, fazendo-o perceber: “Tu vais ser padre porque Deus é Emanuel, porque Ele está comigo em tudo”. Esta confiança renovada ajudou-o a aliviar a ansiedade e a aceitar que o sucesso não depende só dele: “Sei que Deus está comigo, por isso posso estar em paz”.

Nos anos seguintes, apesar de algumas dificuldades, Simão sentiu-se mais tranquilo e foi amadurecendo na sua missão: “Tu tens que habituar-te a não estar onde gostas, mas a gostar do que fazes”.

Sobre o dia da ordenação diaconal, no passado mês de dezembro, é claro: “Foi o dia mais feliz da minha vida! Para mim, foi uma decisão muito fácil. Mas claro que é sempre um ato de fé. Aquela paz foi mesmo de Deus. A paz daquele dia, a serenidade, a felicidade... foi perceber: ‘Foi para isto que eu fui feito, foi para isto que eu fui criado’”. E acrescenta com simplicidade e gratidão: “Aquele rapaz que nunca se sentiu feliz em muitos sítios, aqui é feliz”.

A poucos dias da ordenação presbiteral, o diácono Simão Cruz Ferreira, aluno do Seminário dos Olivais, sente-se confiante, mas consciente da grandeza da missão. “Não estou aqui porque controlo, mas porque fui amado e escolhido e sustentado”, considera.

Quanto ao futuro, não traça grandes planos e só quer ser ele mesmo: “Quanto mais Simão for, melhor será para as pessoas. O verdadeiro Simão, simples com Deus. Quanto mais me entregar às pessoas, quanto mais for livre, mais será Deus a agir em mim”. Neste sentido, este futuro padre reconhece que os primeiros tempos de ministério exigirão entrega total: “Acho que vai ser uma altura de muita confiança, muita fraternidade com outros padres à volta e muita oração. Vai haver temor – já começa a surgir –, mas também um entusiasmo inicial. E depois, a tónica geral terá de ser a humildade. O sucesso dependerá da humildade”.

 

 


 

Diácono Tiago Agostinho: “O Senhor reconstruiu o que estava ferido e preparou-me para anunciar o Evangelho”

O diácono Tiago Agostinho é natural da Brandoa (Amadora) e apresenta um caminho de reconstrução interior, reconciliação familiar e descoberta de um amor que o amou primeiro. Aos 28 anos, às portas da ordenação sacerdotal, reconhece que foi Deus quem o moldou “com tempo e misericórdia” e deseja somente ser “um padre verdadeiro, com os pés na terra e o coração no Céu”.

Filho único, cresceu num ambiente cristão “morno”, mas onde o essencial estava presente. “Cresci num ambiente onde o Evangelho era vivido, ainda que de forma discreta. Era mais pelas minhas avós e tios, mas havia uma educação para a verdade, para a responsabilidade, para a fé em Jesus Cristo”, refere.

Foi a partir da adolescência que a fé começou a ganhar maior expressão: “Aos 15 anos, o Padre Yovanny, que era vigário paroquial e ao mesmo tempo era meu professor de Moral, convidou-me para ir ao centro vocacional. No início fui só para estar com os amigos, mas a Palavra começou a mexer comigo. A pouco e pouco, fui-me confrontando com a pergunta: ‘E se Deus me quiser padre?’”

Tiago admite que vivia com um grande desconforto interior. “Sentia-me um miúdo normal por fora, mas por dentro estava todo estragado. Tinha muitos vícios, não me amava a mim mesmo. Não acreditava que alguém me pudesse amar assim, muito menos Deus. Quando percebi que Ele me ama tal como sou, sem máscaras, foi como se tudo começasse a mudar”, testemunha.

O momento decisivo aconteceu num encontro vocacional na Nazaré, em 2012. “Fizeram um apelo à vocação e eu, sem perceber muito bem porquê, dei por mim de pé, a dizer ‘sim’. Senti que estava a responder a algo maior do que eu. Foi aí que tudo começou verdadeiramente”, considera.

Nos três anos seguintes, enquanto terminava o ensino secundário, continuou o discernimento. “Tive fases de dúvida, fases de maior fervor, fases de tentação também. Mas fui fazendo caminho, com acompanhamento espiritual, oração e muita paciência da parte de Deus”, refere. Tiago sublinha mesmo que nunca teve “uma visão” nem “uma certeza absoluta”: “A vocação foi-se revelando no caminho. Não foi um ‘sim’ repentino, foi um ‘sim’ amadurecido no tempo, no confronto com os meus medos e no silêncio diante de Deus”.

Na ida a Porto San Giorgio, localidade italiana onde está situado um centro do Caminho Neocatecumenal onde os futuros seminaristas são destinados a um Seminário ‘Redemptoris Mater’ de qualquer parte do mundo, Tiago é enviado para um seminário situado a… meia dúzia de quilómetros de casa! Mais concretamente, em Caneças.

Neste seminário diocesano, o desejo era o de se entregar, mas consciente de que muito havia ainda a ser trabalhado: “A grande surpresa foi perceber que Deus não me queria perfeito, mas disponível. Ele ia moldando o barro com tempo e misericórdia”, garante. “Humanamente foi difícil, vindo de uma casa onde era o centro, entrar numa casa com mais de vinte pessoas onde o centro é Cristo. Mas aprendi muito com isso”, acrescenta.

Durante a formação, Tiago viveu várias experiências transformadoras, entre as quais dois anos de missão na Diocese de Beja, um ano na Diocese de Innsbruck (Áustria), e estágios pastorais em Oeiras e Peniche. “Todas essas etapas foram-me ajudando a crescer na relação com Cristo e com os outros. Em Beja aprendi a viver com pouco. Em Innsbruck, aprendi a confiar quando não entendia nada. Em Peniche, aprendi a amar concretamente as pessoas”, frisa.

Mas o mais marcante foi a cura da relação com os pais. “Durante muito tempo, carreguei mágoas. Mas Deus foi-me empurrando com doçura para a reconciliação. Sentámo-nos, chorámos, falámos, pedimos perdão. Hoje há paz. E mais: vi os meus pais regressarem à fé e a entrarem numa comunidade. Isso foi mesmo um milagre”, salienta.

Também a perda dos avós teve um forte impacto neste jovem: “Estive ao lado deles até ao fim. Fiz o funeral do meu avô, mesmo antes de ser diácono. Foi muito duro, mas também foi uma graça. Percebi, com toda a clareza, que a morte não é o fim. Cristo venceu a morte”.

Olhar para trás é, para Tiago, motivo de gratidão. “Deus foi reconstruindo o que estava ferido. Foi-me preparando com paciência, mesmo nas minhas resistências. Hoje percebo que tudo valeu a pena”, assegura. “O Senhor foi-me moldando através de cada experiência, aproximando-me d’Ele, mesmo quando eu não percebia bem o que estava a acontecer”, reconhece.

Marcado por experiências de missão dentro e fora de Portugal, este jovem lembra que é Deus quem toma a iniciativa: “Não fui eu que escolhi ser padre. Foi Deus que me amou primeiro e me chamou”. Por isso, com a ordenação presbiteral à porta, o diácono Tiago Agostinho sente-se em paz: “Sinto-me sereno. Estou feliz. Mas o mais importante é saber que não vou sozinho. Cristo vai comigo”.

Mais do que planos concretos, este futuro padre deseja viver centrado em Cristo e disponível para o povo que lhe for confiado. “O seminário ajudou-me a perceber que fui feito para anunciar o Evangelho. A grande pergunta não é ‘porquê ser padre’, mas ‘para quê?’. E eu sinto que é para anunciar o Evangelho, para levar Cristo às pessoas com a minha vida concreta, para levar a Boa Nova a todos os que encontro”, explica.

Este jovem recorda frequentemente uma frase de Santa Catarina de Sena que o inspira, e que foi verbalizada também, por diversas vezes, por São João Paulo II: «Se fores aquilo que és, incendiarás o mundo». E acrescenta: “Quero ser quem sou, com os meus limites e com aquilo que Deus me deu. Não quero representar o padre ideal. Quero ser verdadeiramente quem sou, com virtudes e defeitos, porque é Cristo que opera em mim. Quero ser o Tiago, padre, com Cristo ao centro. Não quero ser um padre de fachada, mas um padre verdadeiro, com os pés na terra e o coração no Céu”.

O futuro Padre Tiago Agostinho deixa um último desejo: “No dia da ordenação, só peço que o tempo não passe depressa. Quero viver cada momento com intensidade e gratidão. Saborear. Porque, no fundo, o que vou celebrar não é uma conquista minha, mas uma história de amor de Deus comigo”.

 

texto e fotos por Diogo Paiva Brandão
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