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Substituir o medo pela confiança
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Quando há quatro anos foi lançada a campanha contra as armas ligeiras, a reacção foi de estranheza, como que se de questão exótica se tratasse. Hoje, porém, já se assume como algo que nos bateu à porta e com vontade de ficar.

Já não surpreende uma notícia de assalto à mão armada a um banco, a uma caixa multibanco, a uma farmácia, a um supermercado, ou um roubo ao mais pacato cidadão que vai a sair de casa ou a entrar no carro; ou mais grave, o abater a sangue frio aquele que estiver no meio de uma confusão, mesmo que para manter a ordem e a lei. Já não se estranha ouvir falar da escola como palco de repetidas quezílias entre grupos, ficando a sua principal missão, que é educar, secundarizada perante o deprimente espectáculo de uma instituição sem projecto, sem autoridade e sem a nobreza que a caracterizava; ou ainda as relações de vizinhança acorrentadas por energúmenos que da força e da violência fazem lei, perante um sistema de justiça que parece limitar-se à sua intocabilidade em termos formais, desacreditando-se perante a ineficácia das suas intervenções e criando a convicção da impunidade para o prevaricador e da sua inutilidade para a vítima; finalmente ainda a violência no seio da família, transformada em pensão, sem afectos, sem respeito e sem autoridade.

Convencidos desta chaga, nem sempre as reacções são as mais adequadas: a sensação do medo e da insegurança leva as pessoas a fecharem-se dentro de casa e a criarem novas barreiras, reforçando o isolamento e o individualismo.


O olhar da fé

Como crentes, ligando o bom senso aos ensinamentos da Escritura e da Igreja, descobrimos que a criação almeja a paz, que é um reflexo de Deus que criou e viu que tudo era bom; alterar essa bondade gera violência e sangue, como nos mostra a narrativa bíblica de Caim e Abel. Por isso todos somos responsáveis por todos, escreve a encíclica de João Paulo II “Sollicitudo Rei Socialis”, de 30 de Dezembro de 1987. E a “Pacem in terris” (11 de Abril de 1963), de João XXIII, afirma que a fonte última dos Direitos Humanos se situa no mesmo homem e em Deus seu Criador. A violência nunca constitui uma resposta justa, é inaceitável para a solução dos problemas e não é digna do homem, afirmava João Paulo II na Irlanda do Norte, terra paradigmática da contradição vivida por gente que se chama cristã.


Construir a paz

Nalguns locais mais atingidos por esta crise, os crentes, em resposta, têm dado alguns passos: em primeiro lugar procuram apoiar-se na Palavra e pô-la em prática para que não se esteja a construir sobre a areia; em segundo lugar vão imaginando formas de levar as pessoas a recuperarem a confiança no lugar em que vivem e a virem para a rua, como que acenando aos outros que a rua, a praça são de todos e que não as podemos alienar a quem aposta em se tornar lobo para o seu semelhante; finalmente há que trabalhar com todos, numa afirmação de que ninguém é dono de ninguém, mas que não tem o direito de responder como Caim “quem é que me constituiu guarda do meu irmão?”

O retomar o canto dos “Reis” no meio das urbanizações, das vilas antigas ou nas barracas da periferia, a par de alguma estranheza, não deixa de ser um convite alegre e vivo à paz; promover festas abertas a todo o povo como espaço de encontro e de convívio é tão ou mais importante do que a realização de receitas monetárias. Mas também, porque a situação se vai agravando, são os responsáveis políticos que vêem a urgência de actuar com eficácia para que ela não se torne ingovernável; e, sem encobrir as deficiências acima referidas, há que ver gente empenhada nesse projecto a nível governamental, autárquico, das escolas, das instituições locais, das organizações religiosas. Quando, nos começos do corrente ano, foi assinado o primeiro “contrato local de segurança” logo apareceram 27 entidades-parceiras a subscrevê-lo, entre as quais paróquias, comunidades cristãs e a comunidade muçulmana. Relativamente a estas a sua participação tem sido reconhecida de fundamental importância, porque apelando ao que dá consistência aos actos humanos: a transcendência. É assim como um caminhar da Babel para o mundo novo do Pentecostes.

P. Valentim Gonçalves. Comissão Justiça e Paz CIRP
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