É rara a semana em que não há notícia de mais um atentado da milícia islâmica Boko Haram, que pretende dividir a Nigéria, impondo a ‘sharia’ ao norte. Desde 2009 já se contabilizaram milhares de mortos. Os Cristãos são o alvo principal. O mundo parece ignorar esta chacina.
Rua a rua. Casa a casa. Tem sido assim muitas vezes. Grupos de homens armados aparecem de repente, por vezes escondidos pelo escuro da noite, e atacam. Sem piedade. Os alvos são, na sua grande maioria, cristãos. Nem as crianças são poupadas. Entram nas casas, nas igrejas e nas escolas, e disparam. Lançam bombas e granadas. Deitam fogo. Desde 2009 que o grupo islâmico Boko Haram tem colocado o Norte do país em sobressalto. A estratégia é simples: criar, aí, um Estado Islâmico independente. O pânico instalou-se entre as populações. Igrejas, escolas, departamentos governamentais, quartéis do exército, prisões, aldeias… tudo serve, tudo é um alvo para os terroristas do Boko Haram. Depois das mortes e do medo, as populações fogem. Segundo o Gabinete de Coordenação da Ajuda Humanitária das Nações Unidas (Ochoa), calcula-se que cerca de 300 mil pessoas tenham abandonado as suas casas desde Maio do ano passado.
Contradição
A Nigéria é um exemplo da terrível contradição de África. É o seu país mais populoso e possui uma riqueza incalculável: é o principal produtor petrolífero de todo o continente. Porém, a população vive numa enorme e angustiante pobreza, em grande parte por causa da corrupção, que tem alastrado a praticamente todos os sectores da administração pública e da sociedade. As estradas estão esburacadas, falta electricidade e água potável. Em muitas regiões não há escolas nem hospitais. Falta quase tudo.
É aí, perante esse sentimento de impotência e de desalento, principalmente entre os mais jovens, que o Boko Haram tem procurado infiltrar-se e ganhar adeptos.
Ameaça da guerra civil
A Nigéria está dividida entre o Norte, onde predomina a religião muçulmana, e o Sul, maioritariamente cristão. Nesta fase, o Boko Haram pretende criar um Estado Islâmico independente no Norte, mas a sua ambição é estendê-lo a todo o país.
O caminho mais curto para o conseguir é levar a Nigéria ao precipício de uma guerra civil. Esta é a maior ameaça.
D. Hyacinth Egbebo, Administrador do Vicariato Apostólico de Bomadi, vai mesmo mais longe: o que está em causa é o futuro do próprio continente africano.
No início deste ano, numa conversa telefónica com a Fundação AIS, este prelado disse mesmo que, “se a Nigéria cair nas mãos dos extremistas islâmicos, toda a África estará em perigo”.
Milhares de mortos
Os atentados realizados pelo Boko Haram têm sido tantos e tão violentos que ninguém já consegue afirmar quantas pessoas foram mortas desde que iniciaram as suas acções terroristas no ano de 2009. No entanto, todos coincidem num ponto: já morreram milhares de pessoas. Só desde Maio do ano passado, quando foi decretado o estado de emergência em algumas regiões do nordeste da Nigéria, e até ao final de 2013, perderam a vida cerca de 1200 pessoas. Ninguém está em segurança. “O Boko Haram pretende um Estado islâmico no norte do país e impor a ‘sharia’ a toda a gente”, esclarece D. Egbebo. “Assim, tudo o que obstaculize a sua implementação converte-se num alvo para a violência”.
Entre esses obstáculos estão os Cristãos, normalmente associados ao Ocidente e aos valores da liberdade e da democracia. No entanto, não são apenas os Cristãos que estão na mira dos terroristas. O próprio Governo, a Constituição, o exército e a polícia transformaram-se também em alvos objectivos do terror islâmico.
O Administrador do Vicariato Apostólico de Bomadi não tem dúvidas em afirmar que se “o Boko Haram conseguir triunfar no Norte, vai querer estender as suas acções para o Sul. Se conseguirem invadir a Nigéria isso irá servir-lhes como meio para conquistarem países mais pequenos”.
Polvo terrorista
Para o prelado, este grupo terrorista tem “certamente apoios fora da Nigéria”. “Só isso explica o seu profissionalismo, treino militar e o armamento que possuem. Se fossem apenas uma organização nigeriana há muito que estariam derrotados.”
Os apoios externos são difíceis de estabelecer com precisão. São inúmeros os tentáculos do polvo terrorista com ligações ao extremismo islâmico. Antes da queda do regime líbio e do próprio assassinato do seu líder, Muhammad Kadhafi era considerado como um mentor e apoiante do Boko Haram. Independentemente desses laços de terror, que deverão incluir a milícia al-Shabab, da Somália, e o grupo terrorista AQMI, a Al-Qaida do Magreb Islâmico, uma coisa é certa: ser-se cristão na Nigéria significa arriscar a vida todos os dias.
Pedido de ajuda
Da Nigéria chega-nos um grito de alerta. O mundo não pode ficar indiferente perante esta chacina. O Administrador Apostólico de Bomadi não poupa as palavras e dirige-se também a nós: “Não fiquem aí de braços cruzados enquanto a Nigéria se está a desintegrar. É preciso derrotar o Boko Haram. Se o Islão controlar a Nigéria, o resto de África será uma vítima fácil e isso significará um desastre humanitário inimaginável.”
No meio deste caos, a Igreja tem procurado combater a pobreza e a corrupção, tem procurado continuar a sua missão apesar do risco, das ameaças, do medo. Mas a Nigéria não pode ficar abandonada à sua sorte. Diz ainda o bispo: “O Ocidente está demasiado interessado no que pode extrair de África – por exemplo, o nosso petróleo, ou os diamantes da República Democrática do Congo – dando-nos em troca apenas uns presentes insignificantes ou vendendo-nos as armas de que não precisamos. Em vez disso, por favor, ajudem-nos para andarmos pelos nossos próprios pés, para que possamos contribuir para a vida em todo o mundo. África é uma prenda para o mundo, mas África precisa de levantar-se… e nós estamos a morrer”.
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